27 de junho de 2010

Circunstancial, porém lamentável

Como todo jovem inglês, Lampard sonhava em reeditar Geoff Hurst

Ser eliminado nas oitavas-de-final da Copa mais promissora pós-Jules Rimet - e isso não é mero clichê -, pela Alemanha, com goleada e com erro abissal da arbitragem é o maior pesadelo que os ingleses poderiam viver na África do Sul. O primeiro passo para entender o que aconteceu é o estabelecimento de algo muito simples: a goleada - não a eliminação - diante dos alemães foi circunstancial. Não quero tocar no velho debate sobre a exploração de recursos tecnológicos no futebol, uma vez que me parecem óbvias sua viabilidade e sua potencial eficácia. Mas vale dizer que, quando a Inglaterra empatou por 2 a 2 e o gol de Lampard lhe foi tirado, havia duas possibilidades claras: Capello utilizar o evento para enfurecer, no melhor sentido, os jogadores, ou estes sucumbirem definitivamente.

A segunda opção foi estampada na atuação ridícula da equipe na meia-hora final. Sim, a Inglaterra manteve a bola em seus pés durante a maior parte do tempo, mas a postura estabanada e, por vezes, pouco interessada assustou. Após uma série de toques laterais, a Alemanha recuperava a bola com facilidade e partia, com a habitual eficiência na execução de tarefas (e, nesse aspecto, nenhum germânico é melhor do que Thomas Müller), para sempre ameaçar a desastrosa defesa (des)armada por Fabio Capello. Ao fim do jogo, o fato de nenhum inglês ter demonstrado sofrimento com o fracasso também chamou a atenção. Lampard, o menos pior do English Team na partida de hoje, conversava com Schweinsteiger como se estivesse deixando o campo após uma tranquila vitória do Chelsea sobre o Stoke City.

O aspecto físico também foi decisivo. Na jogada do quarto gol alemão, a Hispania de Gareth Barry foi pulverizada pela Red Bull de Özil, que não precisou fazer nada além de correr e controlar a bola, sem resistência, para dar a alegria a Müller. Com Rooney a fazer sua pior partida nos últimos tempos e Capello a ignorar o despedaçado Lennon, são computadas mais duas peças que seriam absolutamente fundamentais a qualquer pretensão de sucesso da Inglaterra.

No fim do cotejo, Capello ratificou sua confusa Copa ao substituir o pendurado Glen Johnson por Wright-Phillips. Daí, surgem algumas perguntas: (1) Qual era a intenção do atrapalhado italiano ao recorrer ao reserva do ignorado Adam Johnson no Manchester City para atuar na lateral-direita, a quatro minutos do fim da tragédia? (2) O que Wright-Phillips, Heskey, Carragher e Warnock faziam na África do Sul? (3) O que Ashley Young, Adam Johnson, Richards e Bent (ou Walcott, Agbonlahor, whoever) fazem na Inglaterra? (4) Foi cogitada a possibilidade de implementação de esquemas alternativos. Se o time estava tão mal nos dois primeiros jogos, por que ele não fez nada para evitar o fracasso?

Não obstante, a Inglaterra fez um jogo razoável contra a Eslovênia, com alguns momentos muito positivos. Diante da Alemanha, os tais momentos positivos ficaram restritos a cinco minutos, quando a equipe marcou, de fato (não de direito), dois gols. Os grandes problemas da fatídica eliminação foram a parca atenção prestada à movimentação alemã e o ridículo posicionamento que permitiu a Klose, Podolski (aquele pessoal que joga a cada quatro anos), Müller e Özil (esse pessoal que deve jogar demais nos próximos dez) fazerem a festa. Não tacharia o trabalho feito nos últimos dois anos de equivocado. Faltou compreender que o planejamento ajuda, mas não garante uma Copa decente. Trabalha-se bem em 24 meses, mas uma sucessão de falhas em 15 dias é suficiente para alimentar o desastre.

Assim, o cansaço e a má fase de alguns jogadores dão razão a Tim Vickery, colunista da BBC no Brasil: "a Copa, para a Inglaterra, chegou com um ano de atraso". Afirmação que, por sua vez, não anula o potencial que esse time tinha para explodir durante o torneio. Por outro lado, os níveis de concentração e gana de alguns jogadores decepcionaram. A única das principais peças que fez jus às expectativas foi o capitão Gerrard, aquele de quem, curiosamente, menos se esperava por conta da fraca temporada. Com ou sem Jorge Larrionda e Mauricio Espinosa, o destino da Inglaterra, com a maior parte dos minutos a que assistimos, seria o mesmo.

Foto: Divulgação

26 de junho de 2010

Sim, é possível

Principal peça inglesa na Copa, Gerrard foi destaque também em Alemanha 1 x 5 Inglaterra, em 2001

Soa um tanto reducionista, mas um simples exercício seria interessante para mensurar o que a Inglaterra pode fazer contra a Alemanha. Pense na formação principal de Joachim Löw. Quantos dos alemães seriam titulares com Fabio Capello, no English Team? Você pode divergir, mas a lógica aponta, no máximo, para Neuer, Lahm, Schweinsteiger e Özil. Ainda assim, o jovem conjunto de Löw, com alguns dos campeões europeus sub-20 de 2009 (o placar da decisão, por sinal, foi 4 a 0 sobre a Inglaterra), fez primeira fase superior à dos ingleses - o que, convenhamos, não exigiu tanta inspiração.

Fato é que o empate contra a Argélia produziu um desequilíbrio das forças do universo. A Inglaterra, que, se primeira colocada do grupo, seria clara favorita para chegar às semifinais, meteu-se em um covil ao lado de Alemanha, Argentina, Espanha e Portugal na corrida por um posto na final. Contudo, a sólida exibição contra a Eslovênia, inspirada pelas óbvias soluções implementadas por Fabio Capello, dão combustível à crença dos ingleses. A morosidade na primeira fase não provocou uma tragédia anunciada. Se repetir, estendendo a todo o jogo, os melhores momentos do triunfo contra os eslovenos, a Inglaterra pode vencer a Alemanha, sim.

Se não escalou Hart, pelo menos Capello sacou Green, que, claramente, não estava minimamente confiante. E existe aquele outro fator, negligenciado por vários treinadores: o desempenho na temporada. Com quatro falhas decisivas, o goleiro do West Ham foi o jogador que mais concedeu gols aos adversários durante a edição 2009/10 da Premier League. A atitude, por ora, deu muito certo: James está seguro. Nas laterais, Johnson melhorou muito e já rende mais do que em qualquer momento da temporada no Liverpool, enquanto Cole demonstra a consistência de sempre. Ambos terão papel fundamental na marcação a Müller e Podolski. Assim como Terry, que, após um jogo sensacional contra a Eslovênia, deve ser suficiente para conter Klose.

No meio, o retorno de Barry não acrescentou tanto por conta de seu parco ritmo de jogo. Mesmo assim, ele vai precisar retormar sua melhor forma contra os alemães e ajudar a dupla de zagueiros na árdua tarefa de acompanhar Özil, que deve jogar entre ele e Terry-Upson (ou, infelizmente, Carragher). Entretanto, a simples presença de Gerrard na esquerda já fez Lampard jogar mais. Ainda que deslocado, o capitão, por sinal, é o melhor jogador inglês na Copa. A herança da faixa lhe roubou a habitual timidez pelo English Team. Ao lado de Ashley Cole, Gerrard será fundamental no duelo, nas duas extremidades do campo, contra Lahm, o capitão e peça mais regular da engrenagem germânica. Os meias ingleses também podem levar vantagem no confronto com os volantes Khedira e Schweinsteiger, que não têm tanta vocação defensiva.

Do outro lado, ao mesmo tempo, a infortuna e o trunfo ingleses. Se estivesse em forma, a velocidade de Lennon seria fundamental para explorar as fraquezas de Badstuber. Entretanto, sua ausência não é motivo para tantas lamentações. Ainda que mais acostumado à faixa central e ao lado esquerdo, Milner foi muito bem como right winger, e sua habilidade e precisão nos cruzamentos compensam o problema. À frente, Defoe deve perder todos os duelos aéreos contra Mertesacker e Friedrich, mas pode vencê-los, por baixo, através da capacidade de antecipação, como no gol diante dos eslovenos. Rooney, por sua vez, é suficientemente forte para brigar com a dupla defensiva alemã.

Não compro o pessimismo disseminado por aí no que se refere à seleção inglesa. Os dois primeiros jogos nada tiveram a ver com o excelente trabalho dos últimos dois anos. Apesar de equívocos na convocação e em escalações, Capello tem capacidade suficiente para perceber as falhas e fazer o time aprimorar a qualidade de seu jogo, mesmo em relação ao triunfo diante da Eslovênia - insistentemente citado neste post. A batalha contra os alemães será complicadíssima, especialmente porque alguns de seus jogadores - Podolski e Klose, notadamente - têm a incrível propriedade de crescer assustadoramente na Copa do Mundo. Mas a Inglaterra pode vencer, sim.

Imagem: The Mirror

12 de junho de 2010

Punido pelas escolhas

Capello prefere a experiência à segurança

A Inglaterra tinha um adversário extremamente familiar. Cinco dos titulares norte-americanos atuaram em clubes ingleses na última temporada. A presença de jogadores de Fulham, Hull City, Everton e Watford dava a sensação de que o conjunto de Capello, cujos atletas jogam no mais alto escalão do país, enfrentava um time médio da Premier League. Apesar da habitual disciplina ianque e dos bons resultados na Copa das Confederações do ano passado, não haveria motivos para a seleção inglesa fazer uma partida tão equilibrada contra os comandados de Bob Bradley. Capello os criou.

O italiano é, seguramente, o maior responsável pela ressurreição inglesa pós-McClaren. Mas é evidente que tem feito escolhas infelizes. A primeira delas foi a não-convocação de Ashley Young, o segundo melhor winger inglês. O peso da ausência de um dos principais jogadores do Aston Villa foi sentido ainda no primeiro tempo de Inglaterra 1 x 1 Estados Unidos. Escalado pelo lado esquerdo por conta da ausência de Barry e do deslocamento de Gerrard ao meio, Milner dava sinais de que a indisposição estomacal havia retornado, atrapalhava-se na marcação de Cherundolo e corria risco de ser expulso. Capello lançou mão de Wright-Phillips, reserva do Manchester City durante a maior parte da temporada.

A formação do meio-campo com Lennon e Wright-Phillips nas pontas já havia sido testada no amistoso contra o Japão. Foi um desastre. Quem jogava à esquerda tinha muitas dificuldades, e o time ficava demasiadamente exposto. Além do ignorado Young, Adam Johnson (excluído na lista definitiva) e até Joe Cole fariam melhor figura. No entanto, uma questão tática indica que a melhor opção seria a escalação de Carrick. Com Barry lesionado, o volante do Manchester United seria fundamental para afastar Gerrard de Lampard, de modo que os meias, de características similares, pudessem jogar à vontade. Com o velho esquema, que fracassa há quase uma década, Lampard simplesmente desapareceu do jogo. A provável volta de Barry e o deslocamento de Gerrard ao lado esquerdo devem melhorar a Inglaterra já contra a Argélia.

Outro problema é a estranha desconfiança em Joe Hart. Com dois goleiros tão propensos a falhas patéticas, é inadmissível que Capello mantenha no banco o mehor goleiro inglês. O fato de ele ter apenas 23 anos não inviabiliza sua escalação. Green é um goleiro de defesas fantásticas, surgiu de forma espetacular no Norwich City, mas erra quase periodicamente - à moda Heurelho Gomes na primeira temporada em White Hart Lane. Hart é seguro e faz defesas com o mesmo grau de dificuldade. O gol de Dempsey foi emblemático. Não para explicar o crônico problema inglês com goleiros, mas para punir Capello por, neste caso, pensar como Dunga e ignorar solenemente o desempenho dos jogadores na temporada e a melhor opção à disposição.

É justamente a esse quadro que pertence a decisão de escalar Heskey, reserva de John Carew no Aston Villa. O ex-atacante do Leicester City não foi exatamente um desastre, uma vez que serviu Gerrard na jogada do gol inglês. Contudo, a finalização dele quando se viu diante de Howard no segundo tempo resume sua temporada. O britânico Martin O'Neill poderia até ficar constrangido ao, sistematicamente, enviá-lo ao banco. Mas não poderia sustentar a campanha do Villa com um atacante tão ineficaz. Defoe é o melhor dos três que disputavam um posto ao lado de Rooney. Crouch, mostraram os amistosos, foi o que produziu a mais interessante combinação com o Shrek. Um esquema com Gerrard mais avançado, como no Liverpool, aproveitaria melhor as qualidades do capitão. Havia alternativas em demasia para aceitarmos a escalação de Heskey sem resistência.

No segundo tempo, com a contusão de King (fora do encontro com a Argélia), Capello escolheu Carragher, de temporada desastrosa no Liverpool. Aos 59 minutos, o zagueiro-lateral poderia (não deveria) ter sido expulso por entrada pesada em Michael Bradley. Cinco minutos após a tensa troca de olhares com Simon, Carragher simplesmente não conseguiu acompanhar Altidore, uma das decepções da temporada da Premier League. O atacante do Hull City obrigou Green a uma defesa quase compensatória. Contra os africanos, veremos se Capello insiste no zagueiro do Liverpool ou resolve apostar em Dawson, que fez temporada mais convincente do que Upson e o próprio Carragher, as outras opções.

Apesar de tantos pontos falhos, a Inglaterra teve boas notícias. Ainda que Rooney tenha mostrado certa dificuldade física durante o jogo, a ótima participação de Lennon é um alento, visto que a velocidade e a eficiência do winger do Tottenham são fundamentais para as pretensões inglesas. Além disso, Gerrard foi o melhor do jogo. Com a faixa de capitão herdada de Terry e Ferdinand, o líder do Liverpool parece ter perdido a habitual timidez na seleção. O autor do gol foi fundamental na cobertura pelo lado esquerdo, organizou o time e chegou à frente de modo eficaz.

Imagem: The Mirror

11 de junho de 2010

Com a palavra, os torcedores

Após algum tempo de folga, o Ortodoxo e Moderno retorna com uma série de reportagens produzida em parceria com meus colegas de Rádio Universitária FM e veiculada durante a semana passada. Aqui, apresentamos as considerações de estrangeiros que vivem em Viçosa (cidade onde moram também os editores deste blog) sobre experiências pessoais e expectativas para a Copa do Mundo. No dia em que a ansiedade pelos jogos é expulsa pelo rolar da Jabulani, você fica com as reportagens, que, evidentemente, foram produzidas com a intenção de atender ao público local, por vezes com perfil divergente daquele dos que visitam este blog. Assim que o intenso ritmo de atividades acadêmicas permitir, voltamos para acompanhar a trajetória da Inglaterra na Copa.

Espanha:


Coreia do Sul:


Estados Unidos:


Portugal:


França: