12 de outubro de 2010

O empate de Fabio

Houve quem sonhasse com um gol de Vucinic após falha de Ferdinand. O provável desfile do montenegrino apenas de cueca, valorizando a façanha e ao mesmo tempo zombando dos ingleses, seria uma punição emblemática a Fabio Capello. Afinal, ele devolveu a faixa de capitão ao zagueiro do Manchester United, roubando-a de Gerrard.

Baseado no preceito de que líderes devem dar bons exemplos, Capello tirou a capitania de Terry antes da Copa e passou-a a Ferdinand, que perderia o torneio por lesão. Se o então capitão Gerrard, o terceiro de sua lista original, é o melhor inglês numa campanha desastrosa e, no primeiro jogo após o fiasco, salva sua pele ao marcar duas vezes na vitória por 2 a 1 sobre a Hungria, inspirando o resto do grupo como um autêntico líder, por que Capello tiraria a faixa dele? Apenas para respeitar uma hierarquia que parecia irrelevante diante do que Gerrard vinha fazendo.

Após a Copa de 2002, Parreira manteve Cafu como capitão da Seleção Brasileira. O lateral-direito do "Eu te amo, Regina" se transformou no líder do quinto título mundial do Brasil apenas porque Emerson, o antigo capitão de Scolari, foi cortado por conta de uma contusão. Mas, é claro, não seria prudente devolver a capitania ao Puma apenas em função de uma hierarquia prévia, que não havia sido estabelecida por Parreira, mas era conhecida por todo o elenco. Cafu foi conservado pelo bom exemplo. Gerrard também deveria ter sido.

Ainda assim, não se sabe se ou até que ponto a volta da faixa ao braço de Ferdinand teve impacto na ridícula exibição da Inglaterra contra a disciplinada seleção de Montenegro. Apesar da liderança montenegrina no grupo, o empate por 0 a 0 não foi tão desastroso porque os ingleses venceram - e muito bem - na Suíça. Entretanto, até pelo contraste entre as últimas atuações e a insossa tarde em Wembley, é preciso investigar o que aconteceu hoje. A apatia do sempre fundamental Gerrard, por exemplo, pode ter a ver com a perda da faixa, com a celeuma envolvendo o Liverpool ou mesmo ser uma simples extensão da fase não tão boa que vive em Anfield.

Mesmo assim, o erro de Capello não é apenas administrativo. Já não é novidade, aliás: o italiano, campeão no inútil quesito "aproveitamento como treinador da Inglaterra", equivocou-se na escalação e nas substituições. Se, enfim, acertou ao lançar os outrora desprezados Adam Johnson e Ashley Young (disparadamente, os melhores wingers à disposição) como titulares, Capello não os posicionou da melhor maneira.

No 4-4-2, a disposição do canhoto Johnson à direita e do destro Young à esquerda não funciona: eles jogam muito longe de gol, ao contrário do que aconteceria no 4-3-3. A menos que eles tenham muita liberdade, o ideal seria privilegiar as jogadas de fundo, que renderiam muito mais à Inglaterra, especialmente com um Crouch ocioso à frente. Johnson até dá certo no City pela direita, mas geralmente no 4-2-3-1, mais próximo da área adversária. Young, por sua vez, costuma se revezar com Downing no Aston Villa. Ora priorizam-se o corte e a finalização, ora priorizam-se as incursões à linha de fundo.

No segundo tempo, Capello resolveu sacar o melhor inglês, Ashley Young, que se virava como podia pela esquerda e distante do gol, para lançar Shaun Wright-Phillips, um dos maiores mistérios de seu trabalho. O rápido winger é reserva absoluto no Manchester City, mas segue ocupando um patamar inexplicável em sua hierarquia - agora a técnica, não a de liderança. É óbvio que ele, em péssima fase, errou quase tudo e minou as já escassas chances de a Inglaterra arrumar um gol. Wright-Phillips já é o Heskey do novo ciclo, em versão reduzida e ligeirinha.

Outro ponto diz respeito ao debutante Kevin Davies, que substituiu Crouch a 20 minutos do fim. Peter estava mal, é bem verdade. Mas... Kevin Davies? Aos 33 anos, ele até tem feito uma boa temporada pelo Bolton, mas os 43% de acerto nos passes, a ausência ofensiva, as três faltas cometidas e o cartão amarelo (para não perder o hábito) já explicam por que ele não deveria ter sido considerado, mesmo na convocação - é incrível, mas os não-lesionados Cameron Jerome, do Birmingham, e Andy Carroll, do Newcastle, mereciam mais (aliás, até Daniel Sturridge, do Chelsea, mas ele tinha compromisso importante com a seleção sub-21).

Capello também poderia ter aproveitado Wilshere para tentar surpreender Montenegro. Se Barry era tão inoperante e jogava em ritmo que nos fez esquecer seus primeiros anos de carreira, os quais ele gastou na lateral esquerda, não eram absurdos os clamores pelo jovem, que vem muito, muito bem no Arsenal. Pelo menos, alguém pensaria um jogo que, só de se pensar, já dava sono.

No fim das contas, o empate com Montenegro é mais de Capello que de qualquer outro, mas também deve ter parcela atribuída aos desempenhos individuais. Gerrard e Barry estavam mal, os laterais não compensavam os pés trocados dos wingers, Rooney perdia gols ridículos, e Crouch pouco contribuiu para vencer uma boa, porém desgastada defesa. Ademais, sem Terry, Lampard, Milner, Lennon e Defoe, as coisas ficariam mesmo um pouco mais complicadas. Ainda assim, a Inglaterra e os ingleses não estão bem. Mais uma vez.

Boa, garotos!
Se há quem tema pelo segundo revés consecutivo em Eliminatórias para a Euro no primeiro escalão, já existe a certeza da classificação para a competição sub-21, que será organizada pela Dinamarca no ano que vem. Após a vitória por 2 a 1 no primeiro jogo, a Inglaterra empatou por 0 a 0 com a Romênia em Botosani e garantiu seu posto. O sucesso ratifica o bom trabalho de Stuart Psycho Pearce, que levou os jovens ingleses à final da Euro 2009.

Imagens: Telegraph, BBC

Um comentário:

Dantas disse...

Nao tem jeito Capello nao deu certo e nem vai dar, foi um grande tecnico mas me parece estar com o mesmo mal que Lippi demonstrou na Azzura.
Será uma crise dos treiadores Italianos, acho que o momento para trocar de tecnico é esse, O'Neil é o certo.
E dar a braçadeira pra Ferdinand foi ridiculo, a tempos Snoop nao vem tendo sequencia.