28 de novembro de 2010

Além do arremesso

A imagem resume Rory Delap, mas não o Stoke de Tony Pulis

Sanli Tuncay, com um toque de calcanhar, assistiu Etherington, que determinou o empate do Stoke contra o Manchester City ao apagar das luzes, no Britannia Stadium. O gol ajudou a estabelecer também a primeira rodada completa da história da Premier League sem clean sheets. Sim, todos os 20 times marcaram. O lance, além de simbolizar a excelente temporada na Inglaterra, representa a capacidade de trabalho dos Potters, costumeiramente tachados de todos os defeitos imagináveis.

O Stoke faz temporada razoável. A instabilidade, caracterizada pela sequência de três derrotas, quatro jogos de invencibilidade, mais quatro reveses e outras quatro partidas sem perder, é ótima para quem luta contra o rebaixamento. Pense no Wigan de 2009-10, de saldo -42, o pior da liga. Os Latics não caíram porque venceram nove vezes em 38 jogos. O Stoke de 2010-11 já acumula seis triunfos em 15 partidas. A questão é: o objetivo de Tony Pulis não se limita a salvar seu time da queda. O saldo acumulado de gols nas duas primeiras temporadas na Premier League foi de -31. Nesta, após mais de um terço do campeonato decorrido, os Potters marcaram tanto quanto sofreram e, assim, podem pensar na primeira metade da tabela.

Nos últimos quatro jogos, o Stoke embolsou 10 pontos. No Britannia, derrotou Birmingham e Liverpool e empatou com o Manchester City. No Hawthorns, atropelou o West Bromwich. Sempre adotando o corajoso 4-4-2 com double pivot, Pulis tem um conjunto que se defende com relativa eficiência e agride muito o oponente. Um dos recursos para efetivar essa agressividade é o poderoso arremesso lateral de Rory Delap, que, diretamente, tem gerado poucos gols, mas sempre põe a defesa adversária em perigo.

Os mísseis de Delap são meramente um artifício, ao qual a regra abre espaço e, mais importante, que não fere nenhum princípio ético. No Tottenham, Crouch é ótimo atacante, mas não é mais habilidoso ou melhor finalizador do que Defoe. No entanto, Redknapp prefere utilizá-lo para assistir, com a cabeça, quem vem de trás: geralmente van der Vaart, em jogada que simplesmente destruiu o Aston Villa há dois meses, em White Hart Lane. Crouch não tem seis assistências no campeonato - uma delas hoje, para Lennon, contra o Liverpool - porque é criativo, mas porque é grande. E Delap é titular porque tem força nos braços.

É no mínimo estranho alguém querer ensinar ao Stoke como se joga futebol. Assim como Redknapp sacrifica um aspecto do jogo para contar com Crouch, Pulis abre mão de Whelan, mais combativo do que Delap, para recorrer aos poderosos arremessos. Não é esteticamente admirável, mas faz parte do repertório de um time longe de ser brilhante. Por esta e, especialmente, por outras qualidades, os Potters, que estrearam na Premier League em 2008-09, devem chegar com tranquilidade à quarta temporada consecutiva na elite. A manutenção faz o clube evoluir, contratar figuras como Kenwyne Jones, por oito milhões de libras.

O elenco do Stoke melhorou muito nos últimos anos. Gudjohnsen, Tuncay e Walters são apenas alternativas. Há dois bons goleiros: Sorensen e Begovic. Shawcross e Jones são ótimos, seriam titulares na maioria dos times da Premier League. Mas o Stoke ainda é, para muitos, o time dos estereótipos. Está claro, entretanto, que uma equipe que vence Newcastle, West Bromwich (conjuntos que derrotaram o Arsenal no Emirates) fora de casa e arranca quatro pontos de Manchester City e do então ascendente Liverpool tem qualidades que vão além do mero artifício dos arremessos laterais. E não é tão ríspido quanto a ideia que muitos fazem da entrada de Shawcross sobre Ramsey, na temporada passada.

Por mais segurança defensiva, Huth é o lateral-direito. Assim como Ivanovic no double do Chelsea na temporada passada e Stam no Milan de 2005-06. Pennant, ex-Liverpool, foi emprestado pelo Zaragoza para oferecer mais velocidade por esse lado. Shawcross, capitão do time, defende como poucos na liga. Etherington, que marcou hoje contra o City, é também um winger decente. Jones compensa as limitações de Fuller. Tuncay, nos segundos tempos, sempre representa ótima alternativa. No fim das contas, o Stoke é criticado por ter nível técnico similar ao do Wolverhampton, por exemplo. A questão é que Pulis sabe explorá-lo ao máximo, faz seus jogadores trabalharem como um verdadeiro time e coloca os Potters na oitava posição da liga, à frente de Liverpool, Aston Villa e Everton.

FA Cup on fire. O sorteio da terceira rodada ratificou o baixo astral do Liverpool na temporada: confronto, em Old Trafford, contra o Manchester United. Por falar em Red Devils, o vencedor entre Brighton e FC United de Manchester, clube criado há cinco anos por torcedores revoltados com o modelo de administração dos Glazer em Old Trafford, enfrenta o Portsmouth. No Emirates, o Arsenal recebe o Leeds United, que, mais uma vez, viu a sorte passar longe de Elland Road. Será o ótimo Jonathan Howson o Beckford desta temporada?

Imagem: Telegraph

25 de novembro de 2010

Candidatura enganosa

Wenger revolucionou o Arsenal. Agora, ele precisa se reinventar

O Arsenal, mais uma vez, goleou uma equipe portuguesa em Londres e perdeu em terreno lusitano em seu grupo na Champions. Há dois anos, 4 a 0 sobre o Porto no Emirates e troco parcial dos azuis e brancos, por 2 a 0, no Estádio do Dragão. Desta vez, o surpreendente Braga, que havia levado 6 a 0 na Inglaterra, superou os de Wenger por 2 a 0 em Portugal. Há sistemáticas oito temporadas, o Arsenal enfrenta adversários teoricamente simples na fase de grupos.

No entanto, como em dois dos últimos três anos, deixou a liderança escapar. Sim, porque é muito improvável que o Shakhtar, três pontos à frente, não vença o Braga em Donetsk, na última rodada. Além de ver distantes o primeiro posto e a perspectiva um oponente fraco nas oitavas-de-final, os Gunners ainda precisam derrotar o Partizan para eliminar completamente a chance de os minhotos, pontuando na Ucrânia, proporcionarem uma desastrosa eliminação.

Curiosamente, o Arsenal de Wenger faz valer a máxima da "competição diferente", independente de desempenhos paralelos. Na Premier League, o conjunto acumula mais pontos fora (aproveitamento de 67%) do que em casa (57%). Na Champions, a lógica é atropelar os adversários no Emirates e cair em terreno inimigo. Arsène, para explicar o que acontece em âmbito doméstico, adota o tradicional discurso de "o adversário vem fechado; fora, temos espaço para jogar". Os oponentes da Champions são frágeis, e os outros ambientes, estranhos. Na Inglaterra, a defesa não suporta os contra-ataques. Na Europa continental, o ataque não cumpre seu papel.

O Arsenal se redimensionou em pouco tempo. O time mais espetacular da história do clube, consistente de 2001 a 2004, tinha várias referências. Este não tem. Depende muito de Fàbregas. O espanhol é a autêntica liderança que se impõe pelo estilo de jogo. Não é, aos 23 anos, capitão por acaso. A propensão de Cesc a contusões, porém, apresenta-se como o primeiro obstáculo a esse sistema: serão mais duas semanas fora de combate. Nasri, que faz ótima temporada, deve voltar a ser jogado aos leões na organização. Com ou sem lesões - e elas sempre vêm -, a excessiva dependência não é compatível com o eterno discurso de "chegou a hora". E aqui a questão deixa de ser a demasiada juventude. Nossos olhos se voltam à atitude de clube vendedor.

É irresistível a sensação de que Touré e Adebayor, liberados para o Manchester City em 2009, podem representar a diferença entre o título e mais uma temporada de ótimas exibições e inexplicáveis escorregões. O Arsenal, de Squillaci, Koscielny e Chamakh, tem pontos fracos fatais: defende-se mal e pode não decidir quando precisa. A lesão de Vermaelen, no início do mês, também pesa. Mas nada torna aceitáveis os nove gols sofridos em sete jogos em casa. Em três destes, aliás, o Arsenal não pontuou: com sete gols marcados, West Bromwich, Newcastle e Tottenham venceram no Emirates. Um índice plausível de sete pontos levaria o Arsenal ao primeiro posto da Premier League, com cinco de vantagem para os hoje líderes Chelsea e Manchester United.

Aliás, um Chelsea titubeante e um United sem referência representam a melhor chance de o Arsenal ganhar o campeonato. O eventual título seria o primeiro desde 2005*, quando os Gunners conquistaram a FA Cup, um hábito na primeira metade da década. Sim, são cinco anos de fracassos, da Carling Cup à Champions (ainda que, em 2006, a jornada europeia tenha sido excelente). Hoje, entretanto, é impossível destituir o Chelsea do posto de favorito (ainda evidente, para ser honesto).

Não se pode, é claro, descartar o Arsenal, mesmo limitado à mediocridade da manutenção de um elenco, pequeno, cheio de jovens que às vezes não completam seu ciclo de evolução - há quanto tempo o grupo tem baixa média de idade? Sem Touré e Adebayor, os Gunners não têm o que até o Liverpool de Hicks e Gillett ostentava: um zagueiro forte (Skrtel) e um atacante poderoso (Torres). O Bolton, com Knight e Elmander, também parece mais bem atendido nesse aspecto. E o Arsenal, com quem podia contar há algumas temporadas? Campbell e Henry.

Outro ponto que chama a atenção é a postura de Wenger. Ele parece se sentir impotente, como se estivesse dirigindo seu time em uma estreita avenida sem saída de apenas uma mão. Extremamente irritado, como quando atirou contra o chão uma garrafa d'água, no terceiro gol do Tottenham no sábado (assistir ao vídeo abaixo), o treinador argumenta superficialmente, quase como um adepto do chororô. Rosicky, Arshavin e van Persie em fase difícil (física, clínica ou técnica) tornam suas opções escassas. Walcott, que poderia ajudar a superar o velho e mau aproveitamento que nunca renderá mais do que a terceira posição, teve a sequência quebrada por lesão.

O Arsenal, hoje terceiro e a dois pontos da liderança, ainda pode ser campeão inglês. Mas nada indica que um resultado surpreendente representaria o sucesso das escolhas de Wenger, de postura autossuficiente, de alguém que pode prescindir de alguns de seus principais nomes sem tanta resistência - Fàbregas, claramente, é um caso peculiar. Lembre-se do título espanhol do insosso Real Madrid de Capello há quatro temporadas: com 23 vitórias, oito derrotas e 76 pontos. O de Pellegrini não levou o título com 31 vitórias e 96 pontos. Esse Arsenal não é, quero dizer, melhor que o de cinco anos atrás, por exemplo. Um eventual - e improvável - sucesso será fruto, sim, dos bons recursos desse time, mas também dos constantes tropeços de Chelsea e United e da imaturidade de Manchester City e Tottenham como candidatos ao título.

*O Arsenal, é claro, pode conquistar uma das copas nacionais. Na Carling Cup, enfrenta o Wigan nas quartas-de-final.




Imagens: Wikipedia, Independent, The Mirror

21 de novembro de 2010

Ainda favorito, mas nem tanto

Chelsea de Carlo Ancelotti vacila na Premier League, mas ainda é o favorito ao título; porém, não mais de forma quase incontestável

Passadas quatorze rodadas, a Premier League começa a dar sinais de que pode ter um campeonato animado e disputado na parte de cima. A diferença entre o líder Chelsea e o sexto colocado Tottenham é de apenas seis pontos. A expectativa, porém, é de que no máximo quatro continuem na briga - e talvez tal estimativa seja otimista demais.

Embora estejam entre os seis primeiros, não é provável que Bolton e Tottenham briguem pelo título. Não que o ótimo conjunto de Harry Redknapp, mesmo com uma defesa abaixo do nível do resto do time, não tenha capacidade para isso: o problema é que a prioridade dos Spurs parece ser a Champions League; logo, enquanto estiverem disputando a competição europeia, é provável que o clube mantenha a sua rotina atual - grandes vitórias contra equipes fortes e derrotas e empates para outras inferiores. Já os Wanderers devem ficar muito satisfeitos caso consigam uma vaga para a Liga Europa: com o elenco que possuem, a conquista já deveria ser muito comemorada.

Contudo, a verdade é que isso tudo não seria dito se o Chelsea, grande favorito ao título, não tivesse fraquejado nas últimas rodadas. Após um início arrasador, os Blues levantaram dúvidas acerca do seu favoritismo ao título depois de perder jogos decisivos contra Liverpool e Manchester City e mostrar antigos problemas de falta de profundidade no elenco quando, cheio de desfalques, perderam para Sunderland e Birmingham.

Com o declínio recente do Chelsea - que conquistou apenas três dos últimos doze pontos possíveis -, vários times encostaram. Além dos já citados Bolton e Tottenham, Arsenal, Manchester City e sobretudo Manchester United estão muito próximos dos londrinos. Esses sim parecem ser candidatos a derrubar o favoritismo inicial de Drogba & Cia. Mas não sem ressalvas.

Arsenal e Manchester City, embora devam ser respeitados, talvez não sejam apostas muito confiáveis. Os Gunners continuam com a sina de vacilar quando assumem ou chegam perto da liderança; isso quando não desperdiçam pontos bobos antes de brigar pela primeira posição, como quando perderam para West Brom e Newcastle em casa. A equipe de Wenger, no final das contas, continua parecendo aquela que precisa amadurecer para chegar ao título. E sempre será enquanto o francês mantiver sua política de investir em times baratos e jovens. E os Citizens continuarão tendendo a tropeçar facilmente enquanto Mancini escalar equipes excessivamente cautelosas, como já tratado aqui.

Já o Manchester United parece ter mais força e consistência para brigar pelo título. É verdade que a temporada dos Red Devils é, até certo ponto, discreta e sem brilho. Além de lidar com problemas defensivos que tiraram pontos preciosos da equipe e quase quebraram a sua invencibilidade na competição, Sir Alex Ferguson sente falta de um líder, já que Nani, o melhor até aqui, ainda não parece ter futebol e maturidade para assumir o papel, vago pelo até agora desaparecido Rooney. Mas os resultados estão aparecendo: aproveitando os problemas do Chelsea, sendo o único a não perder até agora e mesmo conseguindo vitórias pouco vistosas e empates entediantes, já tem os mesmos 28 pontos do rival londrino.

A questão é saber até onde o Manchester United, mesmo sem brilhar, conseguirá bons resultados. Então, considerando todos os problemas pelos quais os times passam, o Chelsea continua sendo o favorito ao título. Colocando todos os problemas na balança, a sensação é a de que os Blues precisam apenas recuperar a forma inicial e voltar a ganhar jogos decisivos; conseguindo o primeiro, o segundo será apenas uma consequência. E para que isso aconteça, é fundamental a volta dos desfalques, algo que já está acontecendo.

Porém, conclusão maior do que essa é a de que não há nessa temporada um clube absoluto na Inglaterra, que possa ser considerado o grande favorito ao título. Agora, o Chelsea é apenas o favorito, seguido de perto pelo Manchester United, tendo o Manchester City e o Arsenal ameaçando os dois - e os Citizens parecem mais fortes que os Gunners, até porque já oferecem indícios de que têm mais chances de consertar os seus problemas. Nada impede, entretanto, que a briga pelo campeonato volte a se polarizar, como nos últimos anos, entre Blues e Red Devils. Na verdade, o desempenho dos seis primeiros na competição tende a essa realidade.

Imagem: The Guardian

18 de novembro de 2010

Com o Pires na mão?

Habitualmente adversários, Friedel e Pires agora somam forças e idades (76 anos) no Villa Park

Robert Pires, aos 37 anos, está de volta à Inglaterra. Gérard Houllier resgatou o compatriota da aposentadoria, e o antigo winger do Arsenal agora presta serviços ao Aston Villa. Pires esteve no Highbury entre 2000 e 2006. O francês era peça fundamental de um time vencedor e encantador, que conquistou, por exemplo, a Premier League de 2003-04 com campanha invicta. O protagonista era Thierry Henry, mas Robert também levantou um troféu individual no norte de Londres: o de jogador do ano pelos jornalistas ingleses, em 2001-02. Infelizmente para Houllier, a referência mais precisa de Pires não é geográfica, mas cronológica. Os últimos quatro anos, no Villarreal, foram somente razoáveis.

Exatamente por isso, o contrato dele com o Villa é de apenas seis meses. O assistente técnico Gary McAllister (que foi jogador de Houllier no Liverpool) vê o negócio como "uma grande oportunidade para os mais jovens". Pires, de fato, pode ensinar muito. São dois títulos na Premier League, três na FA Cup e, de quebra, uma Copa do Mundo. Por outro lado, Houllier imagina não ter contratado apenas um currículo, mas alguém que possa contribuir para tirar os Lions da nona posição no campeonato. A atitude do treinador francês não chega a ser desesperada, mas a aposta em Pires parece ter um quê de impotência para atrair contratações mais seguras.

O Aston Villa tem três entraves: a confiança cega em uma defesa com Collins e Dunne, os meias centrais na enfermaria e a ausência de um bom finalizador. Agbonlahor não atende a este quesito; Heskey e Carew não têm atendido a quesitos. E Pires não é a solução para nenhum dos problemas em questão. Imaginando o que fazia no Highbury, ele reforça o setor mais abastado do time: o dos wingers. Ashley Young e Downing são excelentes, e o jovem Albrighton tem evoluído muito bem. Tanto que Young é, nesta temporada, escalado à frente da linha dos quatro meias, o que abriu espaço a Albrighton pela direita.

Está claro que Pires não deve jogar, em intensidade e posicionamento, como na época de Arsenal. Wenger costumava colocá-lo à esquerda, com Ljungberg no flanco oposto. No Villa, ele pode cumprir função similar à de van der Vaart no Tottenham, no suporte a um atacante único. Isso, supõe-se, nos segundos tempos. Por ora, é difícil acreditar que um jogador de 37 anos, inativo desde maio, chega com fôlego para barrar um Albrighton em plena forma.

A expectativa é de que Pires seja, no Villa, mais uma voz da experiência, como quer McAllister, e um jogador de rotação, para ajudar Houllier na movimentação do elenco. Não se pode exigir mais. Na Inglaterra, as aventuras pós-Arsenal de alguns nomes daquela geração vitoriosa não representam um bom modelo: Ljungberg no West Ham, Lauren no Portsmouth e Vieira no Manchester City não foram (ou não é, no exemplo de Vieira) exatamente um sucesso. Pires pode começar a escrever uma história um pouco diferente a partir de domingo, contra o Blackburn.

Imagem: BBC

Aos ingleses, os brioches

Capello e McClaren: separados por um guarda-chuva (ideia do OptaJoke)

A inspiração dos franceses na vitória por 2 a 1 em Wembley pode ter sido a cautela dosada que levou o Manchester United a duas decisões recentes de Champions League. Ferguson por vezes prescindiu de Tévez e Berbatov, isolou Rooney (ou até Ronaldo) e posicionou Scholes (ou Carrick) à frente da zaga. Era difícil superar aquele 4-1-4-1. Emulando o escocês, Laurent Blanc fez a França controlar a Inglaterra durante a maior parte do tão aguardado amistoso. Com o jovem M'Vila na volância, os quatro armadores - Valbuena, Gourcuff, Nasri e Malouda - ficaram à vontade para dominar o estreante Henderson (Sunderland) e o preguiçoso Barry. A França trabalhou a bola brilhantemente, e Malouda, fundamental para o gol de Benzema, foi o melhor em campo na primeira parte. Os britânicos, ao contrário, mal conseguiam acertar passes.

Capello, entretanto, pensou bem no intervalo. Richards, substituto de Ferdinand, deslocou Jagielka ao miolo da defesa. Ashley Young ocupou a vaga de Barry, de forma que Gerrard, inicialmente escalado no suporte a Carroll, retornasse à meia central. Adam Johnson, por sua vez, barrou Walcott em benefício da lógica do canhoto à direita. O time melhorou um pouco, mas a estrutura da França, já bem treinada por Blanc, continuou mais confiável. Até que Gibbs subiu, fracassou e não conseguiu voltar. Sagna voou pelo setor, assistiu Valbuena e inspirou uma nova canção em homenagem a seu parceiro de Arsenal: Taxi for Gibbs, Taxi for Gibbs, Taxi for Gibbs.

O segundo gol dos Bleus deixou o jogo moroso. Mas a Inglaterra, vale lembrar, tem Crouch. O eficiente atacante, logo no primeiro toque, marcou seu 22º gol pela seleção. O Mr. Clancy, que substituiu Gerrard perto do fim, poderia ter sido a primeira opção de Capello e mantido o fantástico aproveitamento nestas circunstâncias - 18 gols em 17 jogos como titular. Não foi porque o italiano quis oferecer ao bom e esforçado Carroll uma chance. Era pertinente: sem Rooney, Defoe, Bent e Agbonlahor, o centroavante do Newcastle precisava jogar. Ainda que isso implicasse um esquema diferente, com Walcott, Gerrard e Milner se aproximando da área, domínio quase exclusivo de Carroll. Mas a verdade é que o time mais forçou do que construiu jogadas para seu grande homem. Nada deu muito certo.

Os desfalques contribuíram para tanto. Eram pelo menos seis titulares fora. Um hipotético combinado com ingleses lesionados é superior à formação utilizada por Capello. Veja só: Hart; Glen Johnson, Terry, King, Ashley Cole; Lennon, Lampard, Noble, Joe Cole; Rooney, Bent. É difícil armar o time sem tanta gente. Jagielka na lateral direita, Lescott (em má fase) na defesa - que obteve apenas cinco clean sheets nos últimos 18 jogos -, Barry e Henderson na meia central e Gerrard como auxiliar de centroavante não foram exatamente decisões felizes, mas a verdade é que não havia tantas alternativas.

Contudo, por ser Capello o mais impopular dos treinadores da Inglaterra depois do homem do guarda-chuva, sempre há o que criticar. Roberto Mancini, com um elenco abarrotado de meias centrais, justifica a contratação de James Milner deslocando-o à esquerda no Manchester City. Inexplicavelmente, Fabio resolve reeditá-lo. Ora, o City capturou Milner por seu desempenho no primeiro semestre de 2010, como meia central. Com Young e Downing nas pontas, Martin O'Neill encontrou na parceria com Petrov a fórmula ideal para alavancar a carreira de James. Como ele não é tão veloz, mas tem técnica apurada e intensidade, muitos diziam, após seis meses de experimentos, que seria um dos grandes no setor. Mas Mancini e Capello - este por pura teimosia (seriam Henderson e Barry imprescindíveis?) - se recusam a efetivá-lo por ali (ou o fazem em poucos minutos). É cedo, mas Milner parece estar em sua pior temporada desde a miséria técnico-tática no Newcastle.

Outras escolhas também precisam ser revistas. Gibbs, ainda muito inseguro, não deveria ser o reserva imediato de Ashley Cole - Warnock e Baines são mais confiáveis. Henderson tem 20 anos e precisa ter seu potencial explorado, mas Kevin Nolan, de 28, merece uma chance há muito tempo. Mais próximo de Gerrard e Lampard, o capitão do Newcastle tem sete gols na Premier League e vem de temporadas muito consistentes no Reebok Stadium e no St James' Park. A ideia é renovar, dirão alguns. Então, melhor seria se Capello chamasse Sturridge em vez de Bothroyd, também com 28 anos nas costas. Ciclos de dois anos não autorizam o treinador a atropelar a necessidade de vencer em benefício da renovação. É preciso conciliá-las, sem forçar a barra. E não permitir que (mais) um jogo fraco force a nossa amizade.

Montagem: Daily Mail

14 de novembro de 2010

Primo pobre

Rooney e metade dos laterais-direitos de Ferguson, há três anos, em Macau

O Manchester United tinha tudo para vencer, mas não resistiu e empatou novamente: 2 a 2, em Birmingham, diante do Aston Villa. O placar deixou a equipe na terceira posição da Premier League, com média inferior a dois pontos por jogo - o mínimo aceitável para o padrão recente do clube. A paixão do conjunto por empates é tão intensa, que os Red Devils, ainda invictos, acumulam seis em sete jogos como visitante. A única vitória, por sinal, veio através de dois movimentos à moda Solskjaer do promissor Chicharito Hernández, que inspirou os 2 a 1 sobre o Stoke. Na ocasião, não merecia mais do que outro empate contra o enérgico time de Tony Pulis.

Durante boa parte do confronto no Villa Park, o United foi controlado pelos enfraquecidos Lions. Sim, o Aston Villa é, quando completo, um time deveras interessante. Nas últimas semanas, entretanto, Gérard Houllier tem sido vítima de uma desagradável coincidência - alguns chamariam de Lady Murphy. De repente, quase todos os meias centrais do elenco resolveram se juntar ao promissor Fabian Delph na enfermaria. Além da antiga revelação do Leeds United, estão lesionados Petrov, Ireland, Reo-Coker, Sidwell e Clark. Sobraram Barry Bannan, que já havia sido utilizado quatro vezes no campeonato, e Jonathan Hogg, que estreou na Premier League justamente contra o Manchester United.

É intrigante o fato de Carrick e Fletcher não os terem dominado antes dos minutos finais, os da reação. Bannan é promissor, mas Hogg pareceu muito titubeante - o que era até natural. Mas não foi por ali que os mancunianos se perderam e concederam dois gols ao Aston Villa. A diferença entre os dois times ficou restrita a um lado. Enquanto Albrighton, à direita, não fez muito mais do que a conclusão do lance do segundo gol, Downing, à esquerda, promoveu a festa contra Wes Brown, que, duas temporadas depois, voltou a ser frequentemente escalado na lateral. Ashley Young, no suporte a Agbonlahor, também atormentou o defensor aposentado da seleção, responsável pelo pênalti que abriu a porteira.

Brown é um dos oito laterais-direitos que Ferguson escalou em um intervalo de dois anos. O'Shea, Rafael, Neville, De Laet, Fábio, Fletcher e Carrick também passaram por lá. A ausência de um nome confiável para a posição é, por um lado, explicada pelo baixo número de bons laterais destros na Inglaterra. O zagueiro Ivanovic, valendo-se da lesão de Bosingwa e dessa escassez, foi o melhor da temporada passada. Glen Johnson, aquele que tem mais recursos, não engana ninguém desde os tempos de Portsmouth. Quando surge um talentoso, como Séamus Coleman, do Everton, há certa tendência a um deslocamento ao meio-campo - Phil Neville e Hibbert disputam a lateral no Goodison Park.

Ainda assim, é inaceitável que o United não tenha um sólido especialista à disposição. Neville não aguenta mais, e Rafael, a melhor das opções, ainda não consegue defender a contento. A Ferguson, faltou sagacidade no mercado de verão, quando, após ser eliminado da Champions em virtude de uma emblemática falha de seu lateral (que era Rafael, mas poderia ter sido qualquer outro), manteve-se apático e não acionou seus olheiros para aproveitar alguma oportunidade. Por exemplo, o jovem César Azpilicueta, agora no Olympique de Marselha, deixou o Osasuna por 9,5 milhões de euros. Pré-convocado à Copa do Mundo por Vicente del Bosque, o espanhol é um dos mais promissores na posição e, se em Old Trafford estivesse, poderia criar uma ótima concorrência com Rafael em longo prazo.

Hoje, a resolução do problema depende apenas da evolução do brasileiro. É muito pouco. Assim como tem sido insuficiente o investimento nas últimas temporadas, do qual a falta de um lateral-direito confiável é só um símbolo. Novidades da última janela de transferências, Smalling e Hernández taparam dois importantes buracos do elenco, mas a verdade é que a queda de Rooney e a grave lesão de Valencia deixam o time pior do que em 2009-10. É aquela história: não se pode entregar toda a responsabilidade a somente um indivíduo. No ano passado, o clube, que perdia Tévez e Ronaldo, reforçou-se com Owen, Obertan e Valencia.

Sem novos grandes investimentos, é muito difícil apostar no Manchester United. A era dos automatismos, do tic-tac de Paul Scholes (que fez falta contra o Aston Villa) e da velocidade de Giggs, está acabando. Apesar do sensacional início de temporada do meia central, Ferguson não pode mais apostar na velha guarda como base do time. E nem em sua filosofia de polivalência, que lhe dá o direito de escalar quase um terço do elenco na lateral direita. Não é necessário gastar efusivamente - até porque a situação financeira do clube não parece permitir isso. Mas Sir Alex (ou seu sucessor) precisa aproveitar oportunidades para tapar todos os buracos - não apenas os do elenco, mas especialmente os do time titular.

Imagem: China Daily

11 de novembro de 2010

Beleza não é o mais importante

Com Roberto Mancini é assim: ou o jogador mostra que pode ser titular se doando em campo, ou então vai para o banco. Recado que Robinho talvez nunca tenha entendido

Um clássico decepcionante. Foi isso o que se viu na partida entre Manchester City e Manchester United, na última quarta. Um jogo excessivamente concentrado no meio campo, com poucas chances criadas, raros momentos de emoção e dois treinadores medrosos na beira do campo. Sir Alex Ferguson, por exemplo, estava em um daqueles dias em que joga para não perder e achar um gol salvador. É verdade que não contava com jogadores importantes como Giggs e Rooney. Porém, nem isso serve de desculpa para a excessiva cautela apresentada por sua equipe. No máximo, o fato de jogar fora de casa, e olhe lá.

Entretanto, do outro lado havia alguém com atitudes ainda mais contestáveis. Se Ferguson foi responsável por mandar a campo uma equipe cautelosa, preocupando-se mais em defender, Roberto Mancini, treinador dos Citizens, escalou um time com poucos homens de frente. Sem tanto poder ofensivo, o italiano tratou de travar ainda mais o jogo, tendo em mãos um time não muito ousado e sem tanta habilidade com o objetivo de furar uma fortíssima defesa montada pelo adversário. E o ex-treinador da Inter de Milão não se empenhou muito em consertar isso: suas substituições foram extremamente conservadoras, deixando inalterado seu esquema tático e trocando titulares por reservas da mesma posição.

A quem ficou muito irritado com tal atitude, ainda mais se for um torcedor do City, aqui vai um conselho: nem tente se estressar. Pelo andar da carruagem, já parece bem claro que a equipe que foi a campo no último jogo é a base de Mancini. Doa a quem doer, seu time não se preocupa em oferecer espetáculo, e sim em ser combativo e dar o máximo que pode em campo, mesmo que isso signifique que o jogo praticado por sua esquadra não seja nada bonito.

É claro que isso revela algumas opções cornetáveis. Para perceber isso, é só ver como Mancini escala seu time do meio para a frente. A faixa central é congestionada: o polêmico volante De Jong é o responsável por destruir (literalmente) as jogadas, tendo Gareth Barry ao seu lado. Se o inglês não possui uma postura tão defensiva quanto a do holandês, também não se arrisca tanto no ataque como faz Yaya Toure, que joga a sua frente e é um dos responsáveis por criar jogadas para o argentino Carlitos Tevez, homem em quem Mancini parece mais confiar.

No papel, essa parte do time é sem dúvida excelente. Porém, escancara uma preocupante falta de poderio ofensivo e a preferência pelo combate e pela eficiência. O ponto central dessa questão é Yaya Toure. Obviamente o marfinense é um ótimo jogador. Porém, quando Mancini o escala com a responsabilidade de levar seu time ao ataque, ao mesmo tempo em que ganha ao tentar aproveitar seu porte e sua condição física, perde muito por confiar a um jogador não tão habilidoso e criativo a responsabilidade de ajudar na criação de jogadas. E aí o time todo perde, justamente em um setor importantíssimo.

Não há, no entanto, como mudar a cabeça de Mancini. Atualmente, ele vê que o êxito será alcançado com uma equipe combativa, e quem não se enquadar nesse esquema não terá vez. É por isso que Adam Johson, winger de muito futuro na seleção inglesa, muitas vezes é preterido por James Milner, ótimo jogador mas visivelmente sem a habiliade do jogo companheiro de seleção.

Da mesma forma, é por isso que Tevez é seu homem de confiança, e Adebayor, que bateu o pé para sair do Arsenal, é deixado de lado. O argentino enche os olhos de seu treinador por ser reconhecidamente um atacante brigador e que não tem medo de dividida, enquanto o togolês parece pouco disposto a conquistar o mesmo. É por isso que o italiano prefere muitas vezes escalar, num esquema com apenas um atacante, alguém sem tanto faro de gol mas que se doará ao máximo, ainda que deixe tal setor sem uma referência ou sem um homem tipicamente finalizador. Ser lutador é a questão aqui, e quem não se enquadrar, dança. Ou então vai dar um passeio definitivo ou por uns tempos fora de Manchester.

O problema é que Mancini precisa entender que nem sempre seu pensamento deve prevalecer, indo às últimas consequências. Há situações de jogo que pedem equipes mais ousadas e ofensivas, e ele deve estar ponto para fazer as adequadas mudanças no momento certo - coisa que não fez contra o Man Utd. De certa forma, ou ele entende isso da mesma forma que todos entendem que ele quer um time lutador, ou ele ganha ainda mais inimizade e começa a ver sua carreira no comando dos Citizens ameaçada.

Imagem: The Telegraph

7 de novembro de 2010

O óbvio ululante

"Penso, logo existo"

Roy Hodgson, bom observador, percebeu que o 4-2-3-1 não é uma cláusula pétrea do estatuto do Liverpool. O esquema, implantado por Rafael Benítez em 2009, realmente funcionou durante um semestre, enquanto Xabi Alonso ainda estava em Anfield. Depois, foi um fiasco. Hodgson adotou o 4-4-2, já esboçado em algumas ocasiões, desde o princípio contra o Chelsea. O Liverpool, com três desfalques pesados, foi assim escalado: Reina; Kelly, Carragher, Skrtel, Konchesky; Meireles, Lucas, Gerrard, Maxi Rodríguez; Kuyt, Torres.

O 4-4-2 agora divide com a resolução do imbróglio pela venda do clube e o crescimento de algumas peças a responsabilidade pela recuperação, as quatro vitórias consecutivas. Abaixo, listo cinco vantagens do sistema, que inspirou a ótima vitória por 2 a 0 sobre o líder do campeonato. Vale lembrar que nenhum esquema é perfeito, mas um pode ser mais adequado do que outro, dependendo dos jogadores à disposição.

1) Gerrard. O capitão faz a saída de bola, tão prejudicada desde que Xabi Alonso tomou o rumo do Santiago Bernabéu. Mas também não fica muito distante do gol, como no primeiro jogo da Premier League, quando foi um dos volantes do 4-2-3-1 que encarou o Arsenal. Contra o Chelsea, Gerrard voltava a toda reposição de bola de Reina, para organizar o time. Deu muito certo.

2) Lucas. Se Gerrard organiza, Lucas pode se preocupar com outras tarefas. Como meia central, função e direito que Benítez nunca atribuíra a ele, o brasileiro fez seu melhor jogo pelo Liverpool. Combativo, atento (roubou muitas posses) e mais veloz, ele foi um ótimo parceiro para seu capitão. Exibição irrepreensível de um jogador que, em três anos, quase sempre esteve abaixo de seu potencial.

3) Torres e Kuyt. A parceria foi muito eficiente. No 4-2-3-1, Kuyt não teria se deslocado à esquerda para fazer um lançamento espetacular ao espanhol, no lance do primeiro gol. Tanto tempo como meia direita até fez muita gente se esquecer de que o holandês é atacante - e dos bons. Se o Liverpool não tem a bola, ele volta mais do que Torres para contribuir à marcação, transformando o esquema em uma espécie de 4-4-1-1.

4) Os laterais adversários. Eles não têm paz. Quando Ancelotti lançou mão de Bosingwa para tentar explorar o jogo ofensivo pela direita, Hodgson ficou tranquilo. Ele sabia que Maxi estava lá para auxiliar o fraco Konchesky. Do outro lado, Meireles também fez seu papel. O português não é winger, e o ideal é que não jogue assim para sempre. Mas Hodgson identificou uma boa alternativa, pois ele combate o adversário com eficiência e é ágil para criar jogadas, como a do segundo gol de Fernando Torres.

5) Administração do elenco. No 4-2-3-1, faltam peças de reposição a Hodgson. Sem os negociados Sissoko, Xabi Alonso e Mascherano, não sobram muitos volantes. Meireles é subaproveitado por ali. Lucas, tão preso, nunca foi muito bem. Poulsen, sabemos, não é confiável. Assim como Spearing, que até tem potencial. É evidente que esse problema pode ser resolvido em janeiro. Mas, por ora, o Liverpool tem quatro opções contestáveis para a volância. Quando falamos em meia central, a situação é outra.

Veja o que Hodgson, então treinador da seleção finlandesa, disse ao UEFA.com sobre o 4-4-2.

Imagem: Breaking Football News

6 de novembro de 2010

A importância do padrão

O escocês Alex McLeish treinou o conterrâneo Owen Coyle no Motherwell em 1997-98. Agora no Bolton, o ex-atacante segue as lições do mestre.

Martin Petrov, free agent até há pouco, teve o direito de definir seu destino no mercado de verão. Com boa reputação na Inglaterra por conta das três temporadas no Manchester City, o búlgaro preferiu a transferência para o Bolton. A decisão suscitou diferentes impressões. Petrov poderia estar em um time melhor. Petrov escolheu o Reebok Stadium apenas porque queria ser protagonista. Petrov, aos 31 anos e sem utilização regular no último deles em Manchester, estava, na verdade, em franca decadência.

Qualquer que seja a menos mentirosa dessas teses, a visão quase consensual era a de que o left winger poderia inspirar seu novo clube a um estilo distante do chamado futebolton. Mesmo assim, não parecia fácil comprar a ideia de que uma equipe já habituada à medíocre e dura luta contra o rebaixamento apresentaria grandes novidades. Hoje, o Bolton é o quinto colocado da Premier League, com 15 pontos. Petrov pode ter acertado. A substituição de Gary Megson por Owen Coyle no comando técnico explica muito. A despeito de sua polêmica decisão de deixar o Turf Moor no meio da temporada passada, o ex-treinador do Burnley, carismático e emocionalmente vinculado ao Bolton, construiu uma espécie de família Coyle no Reebok.

Com Owen, o Bolton é mais agressivo e, especialmente, adquiriu automatismos. A escalação pode até não se repetir, por conta de um ou outro empecilho, mas não há dúvidas sobre o time e o esquema preferenciais dos Trotters: (4-4-2) Jaaskelainen; Steinsson, Knight, Cahill, Robinson; Lee, Muamba, Holden, Petrov; Davies, Elmander. Mesmo o ponto fraco, os laterais, vão bem. Steinsson, mais cedo, superou Bale no excelente triunfo por 4 a 2 sobre o Tottenham. Os wingers Lee e Petrov (ou mesmo o reserva Matthew Taylor, quando necessário) aceleram o jogo com qualidade, e os atacantes Elmander e Kevin Davies participam muito e têm número satisfatório de gols no campeonato. Mais do que pela pontuação, que não salta aos olhos, o Bolton impressiona pela demonstração de força diante dos grandes.

O padrão que já parece garantir a confortável permanência dos Trotters na Premier League - e até abre espaço a objetivos um tanto mais ousados - é similar ao que levantou o Birmingham na temporada passada. O conjunto de Alex McLeish jogava quase sempre da mesma forma: Hart; Carr, Johnson, Dann, Ridgewell; Larsson, Bowyer, Ferguson (Gardner), McFadden; Chucho Benítez, Jerome. A limitação ofensiva era compensada pela firmeza do time, que sofreu apenas 47 gols em 38 jogos (média de 1,24 por jogo). Nesta temporada, Ben Foster foi vazado 14 vezes em 11 partidas (média de 1,27). A retaguarda, dos ótimos Dann e Roger Johnson, manteve-se forte, mas, ao contrário do que se esperava, o ataque continuou marcando um gol por jogo.

No papel, o Birmingham é bem melhor hoje. McLeish tem as opções de Hleb para a meia e Zigic para o ataque. O elenco é mais profundo, e um simples desfalque (como o de McFadden, que retorna só em fevereiro) não é, em tese, suficiente para desmontar o time. Mas as escalações diferentes são. Agora, o treinador escocês não mantém sequer o 4-4-2. Ora isola Jerome, ora isola Zigic. Ou escala os dois. A presença constante e aparentemente injustificada de jogadores limitados, como Keith Fahey e Garry O'Connor, parece anular o ganho de qualidade do Birmingham no último verão. Além de Hleb e Zigic, chegaram ao St Andrew's Foster (para substituir Hart, é bem verdade), Beausejour, Jiranek, Valles e Derbyshire. Com tantas alternativas ofensivas - e sem precisar depender de Chucho, que retornou ao Santos Laguna -, não é aceitável a marca de um gol por partida.

E não se pode sofrer dois do West Ham, que, antes dessa rodada, havia marcado tantos gols na Premier League quanto Malouda ou Kevin Nolan. O empate por 2 a 2 deixou os Blues na 14ª posição, cinco postos abaixo em relação à classificação final na temporada passada. O aproveitamento do Birmingham despencou de 44% em 2009-10, quando começou mal, para 36% em 2010-11. É claro que a amostra desta edição do campeonato ainda é pequena, de 11 jogos. Entretanto, parece evidente que a perda dos automatismos daquele time quase imutável, o mesmo por nove rodadas consecutivas e imbatível por doze (na divisão de elite, a maior sequência da história do clube), tem tudo a ver com a instabilidade.

Em menos de um ano, o Birmingham deixou de ser a sensação da Inglaterra para se preocupar com a queda. O Bolton, por sua vez, foge ao estereótipo do jogo feio - embora ainda use bastante a bola longa - e passa a ser respeitado mesmo pelos grandes, que, no Reebok Stadium, jamais terão facilidade. Você sabe, hoje, qual o time titular do Birmingham? E o do Bolton? O simples exercício ajuda a entender o que tem acontecido aos dois clubes. Como os treinadores têm competência comprovada e os elencos contam com bons recursos, é mais fácil o Birmingham se achar do que o Bolton se perder.

Imagens: Breaking Football News, Telegraph, Sporting Life

4 de novembro de 2010

Mas Bale é melhor

Nesta foto, Nani pode estar ganhando a disputa com Gareth Bale. Porém, no momento, o galês é mais promissor e mais completo do que o português

Foi no mínimo instigante a declaração dada por Nani na última segunda-feira. Aproveitando o fato de ser o centro das atenções na Inglaterra, devido ao seu polêmico gol contra o Tottenham, o português disse ser um dos melhores do mundo. Não o crucifiquemos: o winger está autoconfiante por ser considerado, com razão, a principal peça do Manchester United nesse início de temporada. Mas os fatos de terça-feira trataram de ofuscar o que foi dito pelo jogador dos Red Devils.

Enquanto o português saía de campo contundido no confronto contra o Bursaspor pela Champions League, Gareth Bale era o dono da bola em White Hart Lane. Dando um banho em Maicon e sendo responsável por duas assistências, o galês liderou os Spurs na vitória de 3 a 1 sobre a Inter de Milão. Mais do que isso: mostrou que, se Nani considera-se um dos melhores do mundo na posição, no mínimo figura atrás de Bale.

Antes de tudo, é necessário dizer que não se pode cair no erro de desmerecer os feitos de Nani pelos Red Devils na atual temporada. Além de ser o jogador que mais tem se destacado na falta de Rooney, seus números provam sua competência até agora: é o líder de assistências na Premier League - oito no total -, além de ser o vice-artilheiro da equipe na competição, com quatro gols. Em ótima fase, já afasta os comentários de que era mais um dos flops de Ferguson, pois não havia justificado os mais de 25 milhões de euros investidos na sua contratação.

O problema é que Nani ainda vive sob estigmas que não o deixam numa posição de relevo no cenário europeu. Afinal, por só ter vingado há pouco tempo, ainda parece passar por diversos testes para provar que é um grande jogador, um world class. Vejamos: no geral, precisa provar que pode ser o dono do Manchester United e o substituto à altura de clássicos wingers da equipe nos últimos tempos, como Ryan Giggs e Cristiano Ronaldo; já num plano individual, deve mostrar que é um jogador completo, principalmente sendo mais consistente e deixando de lado a fama de cai-cai. Ou seja: há a sensação de que ainda deverá melhorar em alguns aspectos se quiser ser um destaque mundial.

Com Bale, a situação é mais favorável. Se antes também já começava a ser considerado um flop, agora vem tendo uma assustadora e meteórica ascensão: em um ano, deixou de ser um mero reserva que mal ganhava jogos para se tornar uma das peças-chave da equipe. Mas o que mais impressiona no galês de 21 anos são duas características que Nani ainda não parece ter: uma capacidade de em certos momentos não poder ser detido, que implica um poder de já decidir grandes jogos.

Os dois encontros entre Tottenham e Inter de Milão pela Champions League mostraram isso, mas o segundo foi mais marcante. Bale foi sensacional: mostrando todas as suas principais características - muita velocidade e preparo físico, habilidade para driblar e deixar adversários tontos, um chute potente e bons e traiçoeiros cruzamentos - foi capaz não só de deixar Maicon como também Lúcio totalmente desmoralizados. Não eram quaisquer jogadores. Era simplesmente metade de uma das defesas mais fortes dos últimos meses: a da Inter de José Mourinho e a da seleção brasileira de Dunga.

Foi dessa maneira, criando boas oportunidades e dando dois passes para gols, que praticamente decidiu os confrontos para os Spurs, merecendo um dos prêmios de Man of the Match mais incontestáveis ultimamente, num confronto inesquecível para os que estiveram presentes em White Hart Lane. E é essa característica de ser decisivo que é mais incisiva em Bale do que em Nani, além de ser um jogador mais imprevisível e inicialmente mais completo.

Nani pode até ascender meteoricamente e conseguir ficar num patamar acima de Bale, mas ainda não conseguiu isso. Da mesma forma, o galês parece mais pronto para assumir a condição de world class, para ser assediado por grandes clubes, e até mesmo para assumir o posto de Giggs no Manchester United - sim, ele provavelmente não ficará muito tempo no Tottenham, e caberia muito bem na renovação proposta por Ferguson.

Imagem: Soccer Cleats 101

1 de novembro de 2010

Preconceito

Não se trata do show de horrores protagonizado por supostos cidadãos no Twitter, que não aceitam derrotas eleitorais, fantasiam razões para uma vitória legítima e, sem qualquer argumento minimamente aceitável, discriminam os brasileiros do Nordeste. Trata-se da décima rodada da Premier League, que, tal qual o bom senso em redes sociais, derrubou ideias preconcebidas.

No clássico de Birmingham, Gérard Houllier fez valer sua autoridade. Stephen Ireland, moeda de troca na transferência de Milner para o Manchester City, começa a causar problemas no Villa Park. Após chegar com status de substituto direto e inconteste do agora jogador dos Citizens (meia central na maior parte da temporada passada, pelo Aston Villa), o irlandês não tem agradado ao treinador francês. "Precisa treinar mais duro", diz o ex-manager do Liverpool. Contra o Birmingham, Stephen, que jogara mal diante do Sunderland, na rodada anterior, foi rebaixado ao banco de reservas. Com vários desfalques, Houllier prescindiu da classe do ex-meia do City em benefício do jovem Barry Bannan, o escolhido para substituir Sidwell no segundo tempo. Ireland amargou a reserva até o fim.

Cardiopata, Gérard voltou ao futebol inglês, pelos portões do Villa Park, sob desconfiança: ele seria emocionalmente forte para suportar momentos agudos ou tomar certas decisões? Houllier sabia que, mesmo mal em outros aspectos, Ireland poderia resolver o jogo com sua capacidade técnica e que seria essencial para cobrir a ausência de Petrov, uma vez que a meia central ficou travada com Sidwell e Reo-Coker. Mas também sabe que vale a pena demonstrar autoridade agora. É melhor do que apostar a qualquer custo numa vitória no dérbi e perder as rédeas de seu mais habilidoso e preguiçoso meia. Ireland, sabemos, não tem cabeça. Houllier pode oferecer esse atributo a ele. Logo o francês, que, especialmente em virtude da cardiopatia, era tachado de fraco do ponto de vista disciplinar.

Roberto Mancini, ao contrário, precisa retomar o controle do grupo do Manchester City. Há quem diga que não existe mais clima para o italiano. Mas é preciso paciência: há duas rodadas, seu trabalho não era contestado externamente. O que precisamos questionar é a excessiva dependência de Tévez. A derrota para o Arsenal veio com um Carlitos ilhado após a expulsão de Boyata. Foi apenas a consumação de uma realidade já transformada em natural: o argentino corre por mais de um jogador e cria a maioria das próprias chances de gol. O problema foi escancarado na absurda derrota para o Wolverhampton, no Molineux, quando Tévez estava fora de combate. A dependência do City em relação ao Apache, aparentemente superior às de Boca, Corinthians e West Ham, soa contraditória para um elenco repleto de opções ofensivas, mas sem tanta gente para abraçar grandes responsabilidades.

O Newcastle, por sua vez, consegue se sustentar ofensivamente. Com dois atacantes fortes - Carroll e Ameobi -, os Magpies golearam sumariamente o Sunderland (que teve o desastroso Titus Bramble, ex-Newcastle, expulso no segundo tempo) no Tyne-Wear derby. O hat-trick do capitão Kevin Nolan foi o destaque dos fantásticos 5 a 1. Não se esperava que a facilidade encontrada no Championship seria reproduzida, mesmo esporadicamente, na Premier League. Pois bem. Ainda que muito irregular, o conjunto de Chris Hughton mostra que velocidade, profundidade e capacidade de finalização, características marcantes desse time, são importantes em qualquer instância. É evidente que a possibilidade de grandes resultados do Newcastle contra equipes do primeiro escalão esbarra numa mera questão de qualidade. Entretanto, ao contrário do que muitos supunham, o veloz time de Hughton é capaz de vencer - e bem - disputas como a do domingo, de inestimável relevância emocional para os torcedores.

Emoções à prova. Os adeptos do Liverpool têm experimentado a sensação mais frequentemente do que gostariam. A segunda vitória consecutiva na Premier League não foi suficiente para atribuir aos triunfos um caráter natural, rotineiro. Pela primeira vez, Hodgson venceu longe de Anfield. Motivação suficiente para uma verdadeira festa no site oficial do clube, que tratou o 1 a 0 sobre o Bolton, que afastou o clube da zona de rebaixamento, como um título. É notório o exagero, ainda que, de fato, os Reds tenham melhorado substancialmente após o dérbi de Merseyside, o primeiro confronto sob os olhares de John Henry, novo proprietário do clube. Entretanto, um aspecto precisa ser considerado: Maxi Rodríguez.

Três titulares do Liverpool pareciam ser os pontos falhos do time: Lucas, Maxi e Konchesky. O brasileiro tem evoluído. Contra Blackurn e Bolton, jogos aceitáveis, mais próximos de seu desempenho na seleção de Mano que de suas apáticas exibições prévias, sob o comando de Benítez ou de Hodgson. Mas o destaque, mesmo, é o argentino. Substituto de Kuyt, Rodríguez parece, aos poucos, retomar o curso do futebol que impressionava no Espanyol, no Atlético, ou mesmo na seleção, especialmente na Copa do Mundo de 2006. Melhor fisicamente, Maxi, autor do gol da vitória no Reebok Stadium, é novamente dinâmico, produtivo. Embora ainda cometa falhas em situações importantes, a movimentação, a contribuição defensiva e a ameaça à retaguarda adversária não podem ser desprezadas. Aqui, o preconceito é deste blogueiro. Preconceito superado pela admissão da melhor forma de Rodríguez.

Contudo, Konchesky segue muito mal. Os problemas com Lee, do Bolton, não foram os únicos que ele não conseguiu solucionar. As ideias preconcebidas de Hodgson, positivas em relação a seu lateral-esquerdo no Fulham e duvidosas sobre Carlos Salcido, custam caro ao Liverpool. Salcido, que fez ótima Copa e era importante peça para o PSV, deixou de ser contratado pelos Reds, que preferiram Konchesky. O Fulham, sagaz, aproveitou para capturar o mexicano, que, por sinal, está na seleção da rodada de Garth Crooks, da BBC. Hoje, está claro que o NESV vai contratar um lateral-esquerdo em janeiro. Fábio Aurélio raramente está saudável, e Konchesky é, por ora, um desastre. Decisão infeliz, a de Hodgson, que até poderia ter segurado Insúa.

Outro ponto importante do esboço de recuperação do Liverpool é a defesa, que minimizou a incidência de gols tolos. O mérito é de muita gente, até de Lucas. Mas uma das grandes vítimas de ideias preconcebidas da liga é quem mais tem se notabilizado pela maior segurança. Sim, Sotirios Kyrgiakos. A presença do ex-zagueiro do AEK, contratado na temporada passada, sempre era razão para desespero. Entretanto, sua participação tem sido providencial. Sem Johnson e Agger, Hodgson precisa de Carragher na lateral direita. Soto (em alusão a Sotirios), como é chamado pelos torcedores, é seguro, arruma bem a defesa e, eventualmente, contribui com gols. O grego não está entre os melhores defensores do mundo, mas não merece ser ridicularizado. Aliás, ninguém merece (ideias preconcebidas).

Imagens: Telegraph, site do Fulham