21 de abril de 2010

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O gol de Eto'o em Stamford Bridge fomentou várias discussões na Inglaterra

Em semana de Champions, fala-se de Champions. Enquanto todos ponderam sobre a possibilidade de a Internazionale eliminar o Barcelona, discutem o poder de decisão de Robben ou comparam o Lyon de 2010 ao Porto de 2004, as equipes inglesas vivem presas em seu universo particular, alheias aos grandes debates. Certa vez, disse aqui que a primeira ausência de clubes da Premier League em uma semifinal de Liga dos Campeões desde 2003 não caracteriza sequer um princípio de crise no futebol local. Embora ainda acredite nisso, é preciso analisar algumas questões para entender o que faltou aos britânicos nesta temporada.

Uma delas é o êxodo de jogadores. Ainda que os grandes clubes ingleses não sejam essencialmente vendedores, houve recentemente algumas perdas que soaram fundamentais para o fracasso. Atraídos por propostas mirabolantes, forçados a negociar por conta da vontade dos jogadores ou equivocados na avaliação do potencial dos atletas, os maiores times da Inglaterra perderam peças que podem ter representado a diferença entre o sucesso e o fracasso. O Ortodoxo e Moderno prepara, então, uma seleção formada por jogadores - e treinador - que recentemente (ou nem tanto) deixaram a Premier League e fazem falta a seus ex-clubes:

Jens Lehmann, Stuttgart, ex-Arsenal. O auge de Lehmann já passou há algum tempo, como sugeriu Wenger ao promover Almunia em 2007-08. Ainda assim, aos 40 anos, o goleiro da espetacular campanha doméstica de 2003-04 e da aventura europeia em 2005-06 seria útil no Emirates. O atual trio de arqueiros não passa qualquer espécie de segurança e ratifica o erro de avaliação do treinador francês. Mesmo experiente, Almunia, que até ensaia bons momentos, comete erros inexplicáveis. Em ainda maior escala, o jovem Fabianski já aterrorizou os torcedores do Arsenal em várias ocasiões, como nos estádios do Dragão, contra o Porto, e DW, diante do Wigan, no último domingo. Mannone, por sua vez, é um goleiro à moda Saulo (ex-Santos, hoje no Ituano).

Lucas Neill, Galatasaray, ex-Everton. O australiano não é exatamente brilhante. Aliás, ele integra esta coletânea apenas por conta da escassez de bons laterais-direitos que tenham recentemente deixado a Inglaterra (poucos estão na Premier League, por sinal). A venda de Neill para a Turquia foi, nesse sentido, deveras estranha. Em janeiro, o Everton ainda não havia se recuperado do péssimo início de temporada. Um dos maiores problemas de David Moyes era justamente a falta de jogadores de defesa, e Neill era constantemente improvisado na zaga central. Mesmo assim, o capitão dos Socceroos foi negociado com o Galatasaray por uma quantia ínfima, após apenas 15 partidas pelo Everton. Apesar da boa forma do time, os torcedores dos Toffees certamente ficam com a sensação de que o australiano poderia ter sido importante no confronto contra o Sporting, responsável pela eliminação do clube na Liga Europa.

Olof Mellberg, Olympiacos, ex-Aston Villa. Mellberg deixou o Villa Park, rumo a Turim, há duas temporadas. Da Juventus, o especialista em jogadas aéreas foi para o Oympiacos, da Grécia. A defesa do Villa parecia ter se acertado nesta edição da Premier League, mas muita gente desconfiava da parceria entre Richard Dunne e James Collins. Até que, em 27 de março, o Chelsea goleou os Lions por 7 a 1 e desmistificou uma solidez que parece depender mais do sistema de jogo, de laterais defensivos e da contribuição de Ashley Young e Downing do que exatamente da competência da dupla de zaga. Por isso, a experiência do sueco seria importante para Martin O'Neill. Em grandes jogos, como o supracitado, ou na desastrosa eliminação ainda na primeira fase da Liga Europa, para o Rapid Viena.

Gerard Piqué, Barcelona, ex-Manchester United. A princípio, o retorno de zagueiro a Barcelona, há duas temporadas, parecia compreensível. O sucesso do United já era embalado por Ferdinand e Vidic, o catalão Piqué queria jogar regularmente, e Evans era tratado como uma boa revelação. Mas hoje a avaliação não é essa. Ferdinand e Vidic sofrem constantemente com lesões, Evans não se mostrou tão seguro, e o Barcelona percebeu que ganhou um defensor de primeira classe. Se tivessem preservado Piqué, os Red Devils teriam um elenco muito mais seguro, um excelente zagueiro com 23 anos e a liberdade de ganhar muito dinheiro com a venda Vidic (caso fosse necessário) sem preocupação imediata com reposição. A precoce saída do espanhol parece fruto de um erro de avaliação de potencial.

John Arne Riise, Roma, ex-Liverpool. O forte lateral-esquerdo norueguês jogou em Anfield por sete anos. No fim de sua jornada em Liverpool, Riise não estava bem e já não era mais consistente do que Fábio Aurélio. Por isso, em 2008, o irmão mais velho de Bjorn Helge (do Fulham) foi negociado com a Roma. No Stadio Olimpico, o lateral reencontrou sua vocação ofensiva e é um dos destaques dos giallorossi na corrida pelo título da Serie A. Se ainda estivesse no Liverpool, Riise seria titular sem qualquer espécie de discussão. Com Fábio Aurélio quase sempre lesionado, Rafa Benítez foi obrigado a promover definitivamente o argentino Insúa, que muito evoluiu desde o início da temporada, mas ainda não transmite confiança aos scousers.

Cristiano Ronaldo, Real Madrid, ex-Manchester United. Talvez ele não faça mais falta do que fariam os 94 milhões de euros arrecadados com sua venda. Mesmo assim, Ronaldo representa para o United a diferença entre a real possibilidade de sucesso em todas as competições e um iminente fracasso na temporada. Felizmente para Ferguson, o equatoriano Antonio Valencia tem atendido completamente às expectativas. Além disso, Rooney abraçou o papel de protagonista, e Nani se recuperou a ponto de invadir o onze inicial do escocês em jogos importantíssimos, como o de Old Trafford de duas semanas atrás, contra o Bayern. Entretanto, ninguém pode substituir Cristiano Ronaldo e o seu magnífico repertório, que passa pelo posicionamento na asa direita, arrancadas, dribles e, especialmente, gols de todas as formas.

Xabi Alonso, Real Madrid
, ex-Liverpool. O elenco dos Reds é praticamente o mesmo da temporada passada. Houve algumas aquisições, como as de Glen Johnson e Aquilani, e outras vendas, como as de Arbeloa e Alonso. Então, o que pode explicar a diferença entre duas e dez derrotas ou entre 75 e 56% de aproveitamento? O volante espanhol é um dos melhores do mundo na combinação de poder de marcação e capacidade de organização. Xabi está, certamente, entre os três jogadores da década em Anfield. Além disso, é imprescindível ao sucesso do 4-2-3-1 de Benítez, esquema que melhor funcionou no Liverpool nos últimos tempos, mas que dependia de uma perfeita composição e de um jogador que fizesse a saída de bola parecer simples. Com Alonso, o Liverpool lutou pelo título até a 37ª rodada. Sem ele, não deve chegar ao penúltimo fim de semana da temporada com chances de classificação à próxima Champions.

Didier Zokora, Sevilla, ex-Tottenham. O volante marfinense chegou ao Ramón Sánchez Pizjuán em 2009, por nove milhões de euros. Como várias outras desta lista, a venda de Zokora ao Sevilla é compreensível. O Tottenham apostava, corretamente, no desenvolvimento de suas peças com características semelhantes às do africano: Tom Huddlestone e o hondurenho Wilson Palacios. Ambos são titulares de Harry Redknapp e fazem temporada satisfatória. Contudo, os Spurs carecem de experiência em 2009-10. A baixa média de idade, sobretudo no meio-campo, deu ao time um positivo caráter jovial, mas também o deixou propenso a tropeços inexplicáveis. As duas derrotas para o Wolverhampton na Premier League e a eliminação da FA Cup pelo Portsmouth são bons exemplos. Zokora seria uma liderança importante nesse sentido.

Arjen Robben, Bayern, ex-Chelsea. Desde a venda de Robben para o Real Madrid, o Chelsea não tem um winger de classe mundial. Apesar da impressionante evolução de Malouda, o holandês seria protagonista em Stamford Bridge (em qualquer lugar, aliás). A propensão a lesões não tira o brilho de um jogador que se habituou a decidir todos os jogos realmente importantes para o Bayern. Se o negócio com os madridistas foi um erro, a omissão no momento em que o craque foi colocado na lista de transferências pelos espanhóis também parece equivocada. Robben é bicampeão inglês pelos Blues e seria o homem certo a conduzi-los ao primeiro título na Liga dos Campeões.

Diego Forlán, Atlético de Madrid, ex-Manchester United. Se dependesse exclusivamente de seu desempenho em Old Trafford, Forlán não deveria passar perto desta lista. Após um ótimo desempenho no Independiente, da Argentina, Alex Ferguson decidiu apostar no uruguaio, que, em dois anos, marcou apenas 17 gols em 95 partidas pelo United, números insignificantes diante dos 150 gols em 210 jogos de seu contemporâneo Ruud van Nistelrooy. Forlán integra esta seleção porque, entre Villarreal e Atlético de Madrid, foi duas vezes artilheiro da Liga Espanhola e Chuteira de Ouro da Europa. Diego tem um instinto goleador que seria o complemento perfeito a Rooney e evitaria o constante aborrecimento com Berbatov.

Thierry Henry, Barcelona, ex-Arsenal. O caso do principal artilheiro da história do Arsenal é semelhante ao de Lehmann. Henry não vive boa fase, mas seria fundamental para Wenger. Depois que saiu do Emirates, em 2007, o atacante francês abriu uma lacuna que, com alguma dificuldade, foi preenchida por Adebayor. Após a saída do togolês, van Persie foi adaptado à função de centroavante. Deu certo, mas a tendência do holandês a graves lesões não permitiu sua efetivação definitiva. Por isso, quando olhamos para Bendtner (que até tem surpreendido nas últimas rodadas) e pensamos sobre o potencial e a identificação de Henry com o clube, é difícil não concluir que o principal nome da equipe nos últimos tempos seria essencial às pretensões nesta temporada.

José Mourinho, Internazionale, ex-Chelsea.
Carlo Ancelotti realiza bom trabalho em Stamford Bridge, mas é difícil que faça os torcedores se esquecerem de José Mourinho, o melhor treinador do mundo no conceito de muita gente. Apesar de ter se limitado a títulos nacionais durante sua passagem pelo Chelsea, o português criou um padrão de solidez e invencibilidade caseira que fez dos Blues o maior clube da Inglaterra em meados da última década. Para intensificar o sentimento de saudade, Mourinho tem conduzido a Internazionale de forma brilhante nesta edição da Champions. Com a eliminação da equipe londrina justamente pelo conjunto do Special One, é impossível ficar indiferente ao campeão europeu de 2004.

Imagens: Football Talk, Telegraph, The Guardian, Henry Goal

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