3 de fevereiro de 2010

Não agrave a crise, Capello

O caráter futebolístico de Terry é oposto a suas atitudes mesquinhas

No Brasil, a faixa de capitão é banalizada por seu uso indiscriminado. Ninguém se importa com ela. O meia Marquinhos, que chegou à Vila Belmiro há pouco, tomou-a para si já nas primeiras partidas como jogador do Santos. Existem infinitos exemplos similares por aqui. Na Europa, lembro-me de um caso. Quando, em 2007, assumiu o Newcastle, Sam Allardyce escolheu para a função o camaronês Geremi, então recém-contratado. Contudo, falo de uma clara exceção que durou apenas alguns meses, período em que Big Sam fez um controverso e mal-sucedido trabalho no St. James Park.

A regra europeia indica que, para ocupar o cargo de capitão, um jogador precisa criar laços com a entidade (clube ou seleção) e alcançar um patamar de plena confiança em relação ao treinador e aos colegas. Como em vários exemplos da vida cotidiana, trata-se de uma conquista que demanda muito tempo, mas pode ser pulverizada com um simples deslize. Por isso, o triângulo amoroso envolvendo o zagueiro John Terry, capitão da Seleção Inglesa e do Chelsea, o lateral Wayne Bridge, do Manchester City, e sua ex-namorada Vanessa Perroncel assumiu contornos dramáticos mesmo no campo futebolístico, a princípio distante da picuinha conjugal.

Em Stamford Bridge, não há problemas. Wayne trocou Londres por Manchester há um ano e, apesar de Terry parecer bastante consternado em campo, a crise que se desenha no English Team passa longe do vestiário do Chelsea, como bem sugeriu Carlo Ancelotti. Quanto à seleção, o debate sobre a eventual mudança na capitania está muito vivo. O treinador Fabio Capello, a quem caberá a decisão, já se pronunciou a respeito, frisando que quer ouvir "a verdade" do capitão e conhecer as opiniões dos outros jogadores. A tendência é que Capello e Terry se reúnam na próxima sexta-feira para chegar a uma resolução.

Evidentemente, o desfecho do caso passa por questões internas, às quais provavelmente não teremos acesso. De todo jeito, a minha impressão é de que Terry deve ser mantido como capitão. O zagueiro, que, de acordo com a BBC, não renunciará ao posto, sempre teve notável conduta profissional. Seu desespero após desperdiçar a chance de dar ao Chelsea o título da Liga dos Campeões em 2008 é apenas um dos indícios do tamanho do comprometimento do zagueiro com as equipes que defende. Desde que assumiu a capitania dos Blues, em 2004, John tem, do ponto de vista futebolístico (por favor, não me interpretem mal), demonstrado caráter e moral irrepreensíveis.

Se pensarmos sobre os possíveis substitutos de Terry, veremos que, em maior ou menor escala, vários já se envolveram em escândalos esportivos ou pessoais. Por não comparecer a um exame anti-doping, Rio Ferdinand foi suspenso por oito meses entre 2003 e 2004. Ashley Cole nunca foi um marido fiel. Steven Gerrard chegou a ser detido por conta de uma briga num bar. Os tabloides britânicos (OK, tenhamos certas restrições quanto a isto) sempre mencionam a tendência de Frank Lampard à boemia. Quando mais jovem, Wayne Rooney tinha incrível afeição por confusões. O antigo capitão David Beckham, por sua vez, não deve ser titular na Copa.

A intenção aqui não é absolver Terry, que errou grosseiramente, ou nivelar a conduta humana de modo rasteiro, mas endossar a vontade dos jogadores, que, segundo notícias recentes, apoiam a manutenção da atual capitania. Por outro lado, Bridge já declarou que, se não houver a mudança, abandonará a seleção. Parece uma opinião muito cruel, mas, neste caso, o melhor a fazer é deixar a faixa no braço de Terry e evitar uma crise muito mais significativa, representada pela perda de um líder inato e da oposição ao desejo da - pelo que se percebe - maciça maioria do elenco. Quanto à lateral-esquerda, o único aspecto conveniente dessa lamentável história: Leighton Baines, do Everton, está bem melhor do que Bridge há muito tempo.

Imagem: The Times

Um comentário:

O autor disse...

Olha, concordo com vc em todos os aspectos. Muitos dizem que a vida pessoal não pode ser levada a campo, mas esse é umn caso extremo, que excede à regra. Terry errou feio, contudo Bridges também não pode misturar o pessoal com o emocional. Ademais, o Baines, do Everton tme jogado muito mais bola que o lateral do City, e, na teoria, deveria ser o reserva de Ashley Cole, mas nõ é. Coisas do futebol.

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Abraçios