28 de abril de 2010

Ode à impunidade

A Premier League é resistente à escalação de jogadores como George Elokobi

Certas posturas hipócritas são deveras irritantes. Assim agiu a Premier League quando multou o Wolverhampton em 25 mil libras por conta da escalação de 10 reservas na partida contra o Manchester United, em Old Trafford, a 15 de dezembro do ano passado. Além do (baixo) prejuízo financeiro, houve discussão e repreensão por todos os lados. Por ora, nenhuma ação prática foi tomada diante das constantes formações enfraquecidas de Roy Hodgson, que tem direcionado as atenções do Fulham para a Liga Europa, mas o insuportável debate voltou à tona.

Esportivamente, poupar jogadores de modo quase indiscriminado não é exatamente uma boa decisão. Entretanto, reitero, administrar o elenco de forma conveniente aos próprios objetivos é, necessariamente, uma faculdade de todos os treinadores. Além disso, é preciso saber por que, exatamente, o Wolverhampton foi punido. O diretor executivo do clube, Jez Moxey, levantou, nesse sentido, um debate interessante: quantas mudanças podem ser feitas em relação ao conjunto teoricamente titular?

Ora, o Manchester United, às vésperas da decisão da Champions da temporada passada, foi ao KC Stadium com um bando de reservas. A equipe já era campeã da Premier League, e seu conjunto principal precisava descansar. Trocando em miúdos: apesar de aquele resultado ter sido potencialmente decisivo na corrida contra o rebaixamento, o jogo nada valia para Alex Ferguson. Mesmo com nenhum titular, o United não foi punido. Então, só posso concluir que a definição sobre o que é inadequado não depende do número de reservas, mas das circunstâncias.

E que circunstâncias são essas? A cabeça de Mick McCarthy funciona de maneira fundamentalista quando falamos da luta contra o rebaixamento. O irlandês molda seu time e suas escolhas a um sistema racional de planejamento que se limita a deixar sua equipe à frente de outros três times. Aquele jogo contra o United, pois, não valia nada para McCarthy. Ele tinha a convicção de que, de qualquer jeito, sairia derrotado de Old Trafford. Logo, por que não se concentraria no jogo seguinte, contra o Burnley? Após a derrota por 3 a 0 contra os Red Devils, os descansados Wolves venceram seu adversário direto por 2 a 0 e, hoje, estão livres do rebaixamento.

Dessa história, os leitores do Ortodoxo e Moderno já devem estar cansados. Mas foi interessante retomá-la. Não apenas pelas boas palavras de Jez Moxey, mas também por conta de uma atitude recente da Premier League. Foi permitida a contratação por empréstimo do goleiro húngaro Martin Fulop, do Sunderland, pelo Manchester City. Com Shay Given lesionado, o clube de Eastlands ignorou seus vários arqueiros disponíveis (incluindo o feroês Gunnar Nielsen, que foi bem contra o Arsenal) e, à procura de nomes mais experientes, solicitou a instâncias superiores a permissão para integrar um atleta ao elenco fora do período para transferências. E conseguiu. O rigor não é regra. A pirraça com os Wolves foi a estranha e injusta exceção.

Imagem: Site do Wolverhampton

26 de abril de 2010

Resumo - 36ª Rodada

Hat-trick de improvável marfinense inspira terceira avalanche do Chelsea em pouco mais de três meses

Manchester United 3x1 Tottenham
(Gols: Giggs (2), Nani; King)
André: Resultado muito bom para o Manchester. Mantém o time firme na briga, mesmo sem Rooney. Já o Tottenham, com a derrota, abriu de vez a briga pela quarta colocação. Villa e City estão chegando.
Daniel: Invencionices de Redknapp (Assou-Ekotto na lateral direita e Bale na esquerda) facilitam vitória do Manchester United, regido pelo ascendente Nani.

Bolton 2x2 Portsmouth
(Klasnic, Davies; Dindane (2))
André: Resultado aceitável. Bolton não vive grande fase, e Portsmouth já está rebaixado. No fim das contas, melhor para o Portmouth. Pelo menos sua torcida não amarga mais uma derrota.
Daniel: Em um quase-amistoso contra o Bolton, Dindane ratifica boa temporada individual e aquece os motores do Portsmouth para decisão da FA Cup.

Hull City 0x1 Sunderland
(Bent)
André: Hull City se credencia definitivamente ao rebaixamento. Ainda mais com o novo Newcastle (West Ham) vencendo. O Sunderland segue na sua, na meiuca, e com Bent decisivo.
Daniel: Mais um gol de Darren Bent rebaixa virtualmente o Hull City e deixa Manchester United de sobreaviso para a batalha do Stadium of Light, na 37ª rodada.

West Ham 3x2 Wigan
(Ilan, Kovac, Paker; Spector, Rodallega)
André: Jogo que pode ter salvado o West Ham do rebaixamento. Destaque para mais um gol de Ilan. Wigan segue na luta na parte de baixo da tabela, mas também não cai.
Daniel: Ilan se notabiliza como a melhor aquisição de janeiro do West Ham, torna contratações de Mido e McCarthy injustificáveis e livra o time da queda ao Championship.

Wolverhampton 1x1 Blackburn
(Ebanks-Blake; Nelsen)
André: Colocaria como decepção por parte do Blackburn. Wolves complicam para alguns, mas a boa campanha do Blackburn deveria ter prevalecido sobre a fragilidade do adversário.
Daniel: Ebanks-Blake acorda da hibernação pós-Championship, marca seu segundo gol na temporada e dá aos Wolves o quarto empate nos últimos cinco jogos.

Arsenal 0x0 Manchester City
André: Resultado aceitável, porém decepcionante. Duas equipes com tanta força ofensiva não poderiam passar em branco. Pior para o City, que é o 6º. O Arsenal já está na Champions, tranquilo.
Daniel: Manchester City protagoniza, novamente, um dos piores jogos da temporada (o outro foi o empate por 0 a 0 com o Liverpool) e se afasta um pouco da quarta posição em tarde marcada pela contusão de Given.

Aston Villa 1x0 Birmingham
(Milner)
André: Muito bom para o Villa. Interessante vitória sobre a boa equipe do Birmingham. O Villa agora é o 5º colocado, atrás do Tottenham. O Birmingham segue em 9º, com boa campanha.
Daniel: Jogador Jovem do Ano mostra maturidade em cobrança capital de pênalti que decidiu mais um equilibrado dérbi de Birmingham e - acredite - ressuscitou o Villa na corrida pela Champions.

Burnley 0x4 Liverpool
(Gerrard (2), Maxi, Babel)
André: Surpresa pelo Liverpool. Mesmo com a diferença do peso das camisas não dava para esperar tantos gols da equipe. Burnley voltará ao Championship. Começou bem, mas...
Daniel: Ao sofrer, em casa, quatro gols de um Liverpool carente de Torres e com aspirações inócuas, o Burnley não poderia esperar algo além de um melancólico rebaixamento pós-Owen Coyle.

Everton 2x1 Fulham
(Smalling (contra), Arteta; Nevland)
André: A boa recuperação do Everton continua, estão na oitava colocação e chegando perto do maior rival. O Fulham faz seu papel e está em 12º, o que poderia se esperar da equipe.
Daniel: Preocupado com a Liga Europa, Fulham arrasta empate quase até o fim, mas gol de Arteta após pênalti controverso mantém Toffees entre as melhores campanhas do segundo turno.

Chelsea 7x0 Stoke City
(Kalou (3), Lampard (2), Sturridge, Malouda)
André: Massacre mostra ao rival Manchester que o líder está mais vivo do que nunca na briga pelo título. Destaque para Kalou, que, além de marcar 3, ainda jogou demais. Ao Stoke só resta esperar a próxima rodada e superar o péssimo resultado dessa rodada; é o 13º.
Daniel: Chelsea marca sete pela terceira vez na temporada (dos 21 gols em questão, Drogba não fez nenhum), prova ter o ataque mais eficaz do campeonato e chega a Anfield com moral alto após promover uma avalanche de gols contra mais uma defesa relativamente segura - a outra foi a do Aston Villa.

Imagem: Zimbio

25 de abril de 2010

Talhado para o título

Sturridge pode ser campeão como coadjuvante, mas já precisa se preparar para assumir grandes responsabilidades

Após o bicampeonato inglês em 2005 e 2006, o Chelsea elevou sua reputação de mero clube endinheirado a outro patamar. À época, as contratações de Ballack e Shevchenko indicavam o novo estágio dos Blues, mas também representavam uma mudança de mentalidade potencialmente danosa. A partir de então, Abramovich passou a adotar um comportamento avesso ao de Arsène Wenger e pouco se preocupou com a aquisição de jovens jogadores. O resultado dessa política parece claro nesta temporada. Carlo Ancelotti trabalha com um time-base repleto de atletas em seus respectivos auges, mas, ao mesmo tempo, próximos do declínio em suas carreiras.

Se tratarmos Cech; Ivanovic, Carvalho, Terry, Ashley Cole; Essien, Ballack, Malouda, Lampard; Anelka e Drogba como a formação titular do Chelsea, veremos que a média de idade do conjunto é de 29,5 anos. Além disso, a variação etária entre o jogador mais velho (Ballack, 33) e o mais jovem (Ivanovic, 26) é pequena. Os fatores em questão fazem dos Blues uma equipe talhada para o título. Mas isso precisa ser executado agora, nesta temporada. A impressão é de que o futuro em Stamford Bridge é completamente nebuloso, dependente do poder e das pretensões de investimento de Abramovich e de jogadores formados no clube, como aconteceu com John Terry no fim dos anos 90.

Após o claro enfraquecimento do Manchester United e a queda vertiginosa do Liverpool, esperava-se uma temporada mais soberana do Chelsea. Com algumas contusões e um desempenho ridículo em fevereiro, o corrida pelo título se reacendeu, e a aura vencedora dos Red Devils faz boa parte dos críticos acreditarem que a taça vai, pela quarta vez consecutiva, para Old Trafford. Para tanto, o Liverpool, sem muitas esperanças na disputa pelo quarto posto e, fundamentalmente, sem Fernando Torres, precisa deter um ataque que, em poucos meses, produziu três das maiores avalanches ofensivas dos últimos tempos no futebol inglês: 7 x 2 Sunderland, 7 x 1 Aston Villa e 7 x 0 Stoke City. Isso sem precisar sequer de um gol de Drogba.

Ainda que, estranhamente, o Chelsea não consiga superar a provável preguiça do Liverpool, não proclamaria o United como campeão. O adversário da turma de Alex Ferguson na próxima rodada é o Sunderland, no Stadium of Light. No primeiro turno, em Old Trafford, Anton Ferdinand precisou marcar contra no acréscimo ao segundo tempo para dar aos Red Devils um celebrado empate. Após o apagão no início de 2010, os Black Cats retornaram à forma que aterrorizou várias equipes no primeiro turno. Foi quando Darren Bent inspirou as vitórias sobre Liverpool e Arsenal. Há algumas rodadas, o próprio Bent, que merece demais uma vaga no avião inglês para a África do Sul, foi o destaque da excelente vitória por 3 a 1 sobre o Tottenham - mesmo com duas cobranças de pênalti desperdiçadas.

Quero dizer que o Chelsea tem algumas opções para conquistar o campeonato (na última rodada, ambos os candidatos devem vencer com facilidade). Um empate entre United, sem Rooney, e Sunderland manteria, necessariamente, a liderança em Bridge. A propensão dos londrinos ao título reside na lógica, no melhor grupo de jogadores e no excelente desempenho em confrontos diretos (12 pontos contra Red Devils e Gunners). Ancelotti tem razão ao dizer que o título está nas mãos do Chelsea. A única vantagem do Manchester United é, honestamente, a tal mística que Ferguson atribuiu ao clube nas últimas duas décadas. Se jogar contra o Liverpool com intensidade semelhante à da partida contra o Stoke, o Chelsea garante seu quarto título inglês e impede a sequência consecutiva de mesmo tamanho dos rivais. A partida contra a horrorosa defesa do Wigan seria mera formalidade.

A Associação de Jogadores Profissionais da Inglaterra (PFA) considerou Wayne Rooney, do Manchester United, o Jogador do Ano. James Milner, do Aston Villa, foi eleito o melhor entre os jovens.

Imagem: Sporting Life

21 de abril de 2010

We miss you

O gol de Eto'o em Stamford Bridge fomentou várias discussões na Inglaterra

Em semana de Champions, fala-se de Champions. Enquanto todos ponderam sobre a possibilidade de a Internazionale eliminar o Barcelona, discutem o poder de decisão de Robben ou comparam o Lyon de 2010 ao Porto de 2004, as equipes inglesas vivem presas em seu universo particular, alheias aos grandes debates. Certa vez, disse aqui que a primeira ausência de clubes da Premier League em uma semifinal de Liga dos Campeões desde 2003 não caracteriza sequer um princípio de crise no futebol local. Embora ainda acredite nisso, é preciso analisar algumas questões para entender o que faltou aos britânicos nesta temporada.

Uma delas é o êxodo de jogadores. Ainda que os grandes clubes ingleses não sejam essencialmente vendedores, houve recentemente algumas perdas que soaram fundamentais para o fracasso. Atraídos por propostas mirabolantes, forçados a negociar por conta da vontade dos jogadores ou equivocados na avaliação do potencial dos atletas, os maiores times da Inglaterra perderam peças que podem ter representado a diferença entre o sucesso e o fracasso. O Ortodoxo e Moderno prepara, então, uma seleção formada por jogadores - e treinador - que recentemente (ou nem tanto) deixaram a Premier League e fazem falta a seus ex-clubes:

Jens Lehmann, Stuttgart, ex-Arsenal. O auge de Lehmann já passou há algum tempo, como sugeriu Wenger ao promover Almunia em 2007-08. Ainda assim, aos 40 anos, o goleiro da espetacular campanha doméstica de 2003-04 e da aventura europeia em 2005-06 seria útil no Emirates. O atual trio de arqueiros não passa qualquer espécie de segurança e ratifica o erro de avaliação do treinador francês. Mesmo experiente, Almunia, que até ensaia bons momentos, comete erros inexplicáveis. Em ainda maior escala, o jovem Fabianski já aterrorizou os torcedores do Arsenal em várias ocasiões, como nos estádios do Dragão, contra o Porto, e DW, diante do Wigan, no último domingo. Mannone, por sua vez, é um goleiro à moda Saulo (ex-Santos, hoje no Ituano).

Lucas Neill, Galatasaray, ex-Everton. O australiano não é exatamente brilhante. Aliás, ele integra esta coletânea apenas por conta da escassez de bons laterais-direitos que tenham recentemente deixado a Inglaterra (poucos estão na Premier League, por sinal). A venda de Neill para a Turquia foi, nesse sentido, deveras estranha. Em janeiro, o Everton ainda não havia se recuperado do péssimo início de temporada. Um dos maiores problemas de David Moyes era justamente a falta de jogadores de defesa, e Neill era constantemente improvisado na zaga central. Mesmo assim, o capitão dos Socceroos foi negociado com o Galatasaray por uma quantia ínfima, após apenas 15 partidas pelo Everton. Apesar da boa forma do time, os torcedores dos Toffees certamente ficam com a sensação de que o australiano poderia ter sido importante no confronto contra o Sporting, responsável pela eliminação do clube na Liga Europa.

Olof Mellberg, Olympiacos, ex-Aston Villa. Mellberg deixou o Villa Park, rumo a Turim, há duas temporadas. Da Juventus, o especialista em jogadas aéreas foi para o Oympiacos, da Grécia. A defesa do Villa parecia ter se acertado nesta edição da Premier League, mas muita gente desconfiava da parceria entre Richard Dunne e James Collins. Até que, em 27 de março, o Chelsea goleou os Lions por 7 a 1 e desmistificou uma solidez que parece depender mais do sistema de jogo, de laterais defensivos e da contribuição de Ashley Young e Downing do que exatamente da competência da dupla de zaga. Por isso, a experiência do sueco seria importante para Martin O'Neill. Em grandes jogos, como o supracitado, ou na desastrosa eliminação ainda na primeira fase da Liga Europa, para o Rapid Viena.

Gerard Piqué, Barcelona, ex-Manchester United. A princípio, o retorno de zagueiro a Barcelona, há duas temporadas, parecia compreensível. O sucesso do United já era embalado por Ferdinand e Vidic, o catalão Piqué queria jogar regularmente, e Evans era tratado como uma boa revelação. Mas hoje a avaliação não é essa. Ferdinand e Vidic sofrem constantemente com lesões, Evans não se mostrou tão seguro, e o Barcelona percebeu que ganhou um defensor de primeira classe. Se tivessem preservado Piqué, os Red Devils teriam um elenco muito mais seguro, um excelente zagueiro com 23 anos e a liberdade de ganhar muito dinheiro com a venda Vidic (caso fosse necessário) sem preocupação imediata com reposição. A precoce saída do espanhol parece fruto de um erro de avaliação de potencial.

John Arne Riise, Roma, ex-Liverpool. O forte lateral-esquerdo norueguês jogou em Anfield por sete anos. No fim de sua jornada em Liverpool, Riise não estava bem e já não era mais consistente do que Fábio Aurélio. Por isso, em 2008, o irmão mais velho de Bjorn Helge (do Fulham) foi negociado com a Roma. No Stadio Olimpico, o lateral reencontrou sua vocação ofensiva e é um dos destaques dos giallorossi na corrida pelo título da Serie A. Se ainda estivesse no Liverpool, Riise seria titular sem qualquer espécie de discussão. Com Fábio Aurélio quase sempre lesionado, Rafa Benítez foi obrigado a promover definitivamente o argentino Insúa, que muito evoluiu desde o início da temporada, mas ainda não transmite confiança aos scousers.

Cristiano Ronaldo, Real Madrid, ex-Manchester United. Talvez ele não faça mais falta do que fariam os 94 milhões de euros arrecadados com sua venda. Mesmo assim, Ronaldo representa para o United a diferença entre a real possibilidade de sucesso em todas as competições e um iminente fracasso na temporada. Felizmente para Ferguson, o equatoriano Antonio Valencia tem atendido completamente às expectativas. Além disso, Rooney abraçou o papel de protagonista, e Nani se recuperou a ponto de invadir o onze inicial do escocês em jogos importantíssimos, como o de Old Trafford de duas semanas atrás, contra o Bayern. Entretanto, ninguém pode substituir Cristiano Ronaldo e o seu magnífico repertório, que passa pelo posicionamento na asa direita, arrancadas, dribles e, especialmente, gols de todas as formas.

Xabi Alonso, Real Madrid
, ex-Liverpool. O elenco dos Reds é praticamente o mesmo da temporada passada. Houve algumas aquisições, como as de Glen Johnson e Aquilani, e outras vendas, como as de Arbeloa e Alonso. Então, o que pode explicar a diferença entre duas e dez derrotas ou entre 75 e 56% de aproveitamento? O volante espanhol é um dos melhores do mundo na combinação de poder de marcação e capacidade de organização. Xabi está, certamente, entre os três jogadores da década em Anfield. Além disso, é imprescindível ao sucesso do 4-2-3-1 de Benítez, esquema que melhor funcionou no Liverpool nos últimos tempos, mas que dependia de uma perfeita composição e de um jogador que fizesse a saída de bola parecer simples. Com Alonso, o Liverpool lutou pelo título até a 37ª rodada. Sem ele, não deve chegar ao penúltimo fim de semana da temporada com chances de classificação à próxima Champions.

Didier Zokora, Sevilla, ex-Tottenham. O volante marfinense chegou ao Ramón Sánchez Pizjuán em 2009, por nove milhões de euros. Como várias outras desta lista, a venda de Zokora ao Sevilla é compreensível. O Tottenham apostava, corretamente, no desenvolvimento de suas peças com características semelhantes às do africano: Tom Huddlestone e o hondurenho Wilson Palacios. Ambos são titulares de Harry Redknapp e fazem temporada satisfatória. Contudo, os Spurs carecem de experiência em 2009-10. A baixa média de idade, sobretudo no meio-campo, deu ao time um positivo caráter jovial, mas também o deixou propenso a tropeços inexplicáveis. As duas derrotas para o Wolverhampton na Premier League e a eliminação da FA Cup pelo Portsmouth são bons exemplos. Zokora seria uma liderança importante nesse sentido.

Arjen Robben, Bayern, ex-Chelsea. Desde a venda de Robben para o Real Madrid, o Chelsea não tem um winger de classe mundial. Apesar da impressionante evolução de Malouda, o holandês seria protagonista em Stamford Bridge (em qualquer lugar, aliás). A propensão a lesões não tira o brilho de um jogador que se habituou a decidir todos os jogos realmente importantes para o Bayern. Se o negócio com os madridistas foi um erro, a omissão no momento em que o craque foi colocado na lista de transferências pelos espanhóis também parece equivocada. Robben é bicampeão inglês pelos Blues e seria o homem certo a conduzi-los ao primeiro título na Liga dos Campeões.

Diego Forlán, Atlético de Madrid, ex-Manchester United. Se dependesse exclusivamente de seu desempenho em Old Trafford, Forlán não deveria passar perto desta lista. Após um ótimo desempenho no Independiente, da Argentina, Alex Ferguson decidiu apostar no uruguaio, que, em dois anos, marcou apenas 17 gols em 95 partidas pelo United, números insignificantes diante dos 150 gols em 210 jogos de seu contemporâneo Ruud van Nistelrooy. Forlán integra esta seleção porque, entre Villarreal e Atlético de Madrid, foi duas vezes artilheiro da Liga Espanhola e Chuteira de Ouro da Europa. Diego tem um instinto goleador que seria o complemento perfeito a Rooney e evitaria o constante aborrecimento com Berbatov.

Thierry Henry, Barcelona, ex-Arsenal. O caso do principal artilheiro da história do Arsenal é semelhante ao de Lehmann. Henry não vive boa fase, mas seria fundamental para Wenger. Depois que saiu do Emirates, em 2007, o atacante francês abriu uma lacuna que, com alguma dificuldade, foi preenchida por Adebayor. Após a saída do togolês, van Persie foi adaptado à função de centroavante. Deu certo, mas a tendência do holandês a graves lesões não permitiu sua efetivação definitiva. Por isso, quando olhamos para Bendtner (que até tem surpreendido nas últimas rodadas) e pensamos sobre o potencial e a identificação de Henry com o clube, é difícil não concluir que o principal nome da equipe nos últimos tempos seria essencial às pretensões nesta temporada.

José Mourinho, Internazionale, ex-Chelsea.
Carlo Ancelotti realiza bom trabalho em Stamford Bridge, mas é difícil que faça os torcedores se esquecerem de José Mourinho, o melhor treinador do mundo no conceito de muita gente. Apesar de ter se limitado a títulos nacionais durante sua passagem pelo Chelsea, o português criou um padrão de solidez e invencibilidade caseira que fez dos Blues o maior clube da Inglaterra em meados da última década. Para intensificar o sentimento de saudade, Mourinho tem conduzido a Internazionale de forma brilhante nesta edição da Champions. Com a eliminação da equipe londrina justamente pelo conjunto do Special One, é impossível ficar indiferente ao campeão europeu de 2004.

Imagens: Football Talk, Telegraph, The Guardian, Henry Goal

19 de abril de 2010

Podcast - Rodada 35



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15 de abril de 2010

Pluripartidarismo

Tévez e Rooney evoluíram justamente quando a parceria ruiu

A Associação de Futebolistas Profissionais já delimitou o (óbvio) grupo dos melhores da temporada inglesa. Wayne Rooney, Didier Drogba, Francesc Fàbregas e Carlos Tévez concorrem ao prêmio de jogador do ano. Rooney e Fàbregas ainda disputam a distinção de melhor jogador jovem. Eles podem reeditar Andy Gray (ex-atacante do Aston Villa) e Cristiano Ronaldo, que fizeram a dobradinha em 1977 e 2007, respectivamente. Os outros indicados vêm de Birmingham: o goleiro Joe Hart e o meia James Milner.

O blog Ortodoxo e Moderno exerce o pluripartidarismo e expõe diferentes visões que explicam por que Rooney, Drogba, Fàbregas e Tévez merecem vencer. Vale lembrar que as "campanhas" não representam necessariamente a opinião deste que vos escreve. Tratam-se apenas de instrumentos para ilustrar os excelentes desempenhos do quarteto.

Wayne Rooney. O melhor jogador de uma temporada precisa ser, fundamentalmente, um protagonista. E ninguém, nesta temporada, representou tanto para seu time quanto Rooney. Outro atributo essencial é a capacidade de se reinventar, evoluir seu jogo. Com Cristiano Ronaldo fora de Manchester, o Shrek passou a marcar em profusão e tornou-se letal em um fundamento que não dominava. Até a temporada passada, ele marcava 3,6% de seus gols com a cabeça. Em 2009-10, cerca de um terço das comemorações de Rooney se deve a cabeceios.

Didier Drogba. PFA Player of the Year. Atribuição não daqueles que fazem tudo sozinhos, mas de quem, aliado ao conjunto, impulsiona o sucesso do clube. Como na NBA, o prêmio deve ser destinado ao melhor jogador do melhor time. As quatro vitórias contra Arsenal e Manchester United na temporada deixam o Chelsea próximo de seu quarto título nacional. Drogba marcou em três das quatro ocasiões. Os 25 gols do marfinense não foram quaisquer instrumentos de apoio para os Blues. Eles são diretamente responsáveis pelo provável título.

Francesc Fàbregas. A qualidade de um jogador é medida pela quantidade de funções que ele consegue executar com categoria. Não há contestação a um meio-campista que, mesmo atormentado por lesões, acumulou 15 gols e 15 assistências em apenas 27 partidas. Fàbregas, de 22 anos, é o capitão da boa campanha do Arsenal. Apesar da impropabilidade do título, a temporada dos Gunners é surpreendente, uma vez que houve progresso em relação a 2008-09, quando o elenco era melhor. E eles devem isso a um organizador de classe mundial. Com ele, o aproveitamento é de 71,6%. Sem ele, de 61,9%.

Carlos Tévez. O Apache tem tudo para ser o responsável pelo maior avanço da temporada. Se chegar à Champions, o Manchester City terá cumprido seu objetivo em 2009-10. Parece simples, sobretudo após os polpudos gastos com contratações em agosto. Mas a quarta posição dos Citizens é, claramente, obra do Jogador do Mês de dezembro na Premier League. Com 20 gols nos últimos 18 jogos, Tévez tem sido o melhor da temporada porque, mesmo sem os naturais holofotes da corrida pela taça, consegue se destacar tanto quanto seus concorrentes.

Imagem: Daily Mail

12 de abril de 2010

Podcast - Rodada 34



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11 de abril de 2010

Domingo emblemático

Com 20 gols nos últimos 18 jogos, Tévez inspira a ascensão do City

A quarta vaga inglesa na Liga dos Campeões deve ser do Manchester City. Ao chegar a Eastlands, Roberto Mancini fez os necessários reparos defensivos, mas o ataque viveu um período difícil, de completa dependência em relação a Tévez. No entanto, após a contratação de Adam Johnson, o sistema ofensivo dos Citizens melhorou bastante até atingir um estágio demolidor. Nos últimos três jogos, os seis gols de Tévez foram acompanhados por outros oito. Três dos seis gols contra o Burnley foram marcados num intervalo de 153 segundos. Três dos cinco diante do Birmingham saíram num espaço de cinco minutos. Essa capacidade explosiva e a segurança na defesa evidenciam uma melhora considerável em relação aos tempos de Mark Hughes.

Ainda mais quando pensamos no que aconteceu hoje. O Manchester City atropelou uma das mais sólidas defesas da Inglaterra, a do Birmingham. A mesma que conteve o ataque do Liverpool na semana passada durante os minutos finais no St. Andrews. Na ocasião, David N'Gog tinha a incumbência de marcar. Assim como hoje, em Anfield, contra o Fulham. Sem o novamente lesionado Fernando Torres, o francês foi o único homem de frente dos Reds na prévia da eventual final da Liga Europa. Não houve gols. O domínio vermelho foi absurdo: 17 chutes contra apenas um dos Cottagers, recorde negativo na temporada da Premier League. Travado pela própria limitação no elenco ofensivo, o Liverpool está fora da luta pela quarta posição.

Já o Tottenham estava preocupado com a Copa da Inglaterra. Apostava em Harry Redknapp, campeão há dois anos com o Portsmouth, para levantar o troféu pela nona vez. O adversário era justamente o Pompey, mergulhado em crise financeiro-administrativa, com um elenco muito fraco e já relegado ao Championship da próxima temporada. O ligeiro domínio dos Spurs não foi suficiente para que houvesse um gol no tempo convencional em Wembley. Na prorrogação, o melhor equilíbrio do Portsmouth e uma arbitragem controversa geraram um resultado absolutamente inesperado. Com uma derrota patética por 2 a 0, o Tottenham perdeu a chance de fazer a final contra o Chelsea.

E o que isso tem a ver com a corrida por uma vaga na Champions? O resultado escancara uma característica lamentável da equipe londrina: a propensão a tropeços ridículos. Apesar de ter vencido o próprio Manchester City por 3 a 0 em White Hart Lane, os Spurs costumam se atrapalhar quando as circunstâncias são favoráveis. Nos dois jogos contra o Wolverhampton, por exemplo, a equipe não somou pontos. Aliás, nem marcou gol, perdendo os dois confrontos por 1 a 0. Tal qual o Liverpool, o Tottenham parece precisar de um domínio substancial para vencer. Quando faz jogos equilibrados, ou mesmo contra defesas muito bem postadas, o time de Redknapp geralmente não consegue triunfar.

Com o Tottenham impotente pela árdua reta final e o Liverpool excluído pela matemática, o City, também com jogos complicados até o fim, já visualiza os dois confrontos que precisa vencer: contra Aston Villa (oito pontos e um jogo a menos), 1º de maio, e o próprio Tottenham (quatro pontos e um jogo a menos), quatro dias depois. Os dois desafios serão em Manchester, o que atribui significativo favoritismo à equipe de Mancini. Endinheirados, ainda que fracassem agora, os Citizens já são a quarta força da Premier League.

A provável conquista da vaga na Champions, potencializada pelo emblemático domingo de agonia dos concorrentes e convincente goleada, não será como a fortuita campanha do Everton em 2004/05. Ela fará parte de um processo consistente, que tem um condutor (Mancini), um protagonista (Tévez) e um grande espaço livre para se desenvolver. Alex Ferguson, adversário na próxima rodada, já pode parar com as piadas e as intimidações proferidas na direção do, agora sim, rival à altura.

Imagem: The Mirror

7 de abril de 2010

Fogueira sem brasa

Quando Bullard cai, o KC Stadium vive um minuto de silêncio espontâneo

A eliminação do Manchester United diante do Bayern e a consequente ausência de representantes ingleses nas semifinais da Liga dos Campeões pela primeira vez desde 2003 ainda não caracterizam um cenário preocupante para o futebol nacional. Entretanto, despertam nossa atenção para outro aspecto: vários clubes da Premier League dependem excessivamente de seu principal jogador.

O retorno de Rooney estava previsto para a partida contra o Tottenham, no dia 24, pela 36ª rodada da Premier League. Estranhamente, o Shrek foi escalado 17 dias antes. Embora tenha feito boa figura, o atacante, substituído no segundo tempo, claramente atuou em condições inadequadas. Ferguson escolheu o risco por conta do provável incômodo com a impotência de seu conjunto, sem Rooney, durante a maior parte do jogo contra o Chelsea, no último sábado.

Confira os outros clubes muito dependentes da presença e inspiração de um jogador:

Arsenal, Cesc Fàbregas. O capitão dos Gunners marcou, contra o Barcelona, o gol que enterrou as chances de uma temporada vitoriosa no Emirates. No lance, o espanhol teve o quinto metatarso do pé esquerdo fraturado (tipo famoso de lesão na Inglaterra) e está praticamente fora da temporada. Sem ele, o Arsenal esteve próximo da nulidade no Camp Nou e deve perder pontos imprescindíveis na luta pelo título.

Manchester City, Carlos Tévez. O elenco dos Citizens é muito forte, especialmente em termos ofensivos. No entanto, a equipe só conseguiu rondar a quarta colocação quando Tévez iniciou uma sequencia notabilizada por hat-tricks, gols decisivos e atuações irrepreensíveis. Jogador do Mês de dezembro na Premier League, Carlitos, com 20 gols na liga, é o responsável pelo favoritismo do Manchester City na corrida pela Champions.

Liverpool, Fernando Torres. Torres é, certamente, um dos cinco melhores atacantes do mundo. Mas a dependência dos Reds em relação a El Niño não passa exatamente por isso. O Liverpool agoniza de forma assustadora sem o espanhol simplesmente porque não tem alternativas decentes. Quando Benítez chama N'Gog, os scousers sabem que o time precisará batalhar muito para marcar.

Sunderland, Darren Bent. O ex-atacante do Charlton tem 22 gols na Premier League, nove marcados nos quinze primeiros minutos dos jogos. A campanha dos Black Cats desabou quando, entre abstinência e lesão, Bent passou por uma fase não tão espetacular. A equipe de Steve Bruce, uma das mais agradáveis das rodadas iniciais, ficou 14 jogos sem vencer e chegou a correr risco de rebaixamento. Com Bent de volta à boa forma, uma curta sequência positiva já foi suficiente para tranquilizar o ambiente no Stadium of Light.

Hull City, Jimmy Bullard. Destaque no Wigan e, em menor escala, no Fulham, Bullard, de 31 anos, é um talento tardio. Desde janeiro de 2009 no KC Stadium, o inglês tem sofrido muito com lesões. O meia criativo foi o Jogador do Mês de novembro na Premier League ao elevar o padrão dos Tigers. Nas semanas em que (novamente) ficou fora por contusão, o time naufragou. Quando voltou, reacendeu as esperanças da equipe de escapar do rebaixamento.

*Há outros times em situação parecida, mas não considero que a dependência seja tão expressiva. O Tottenham, por exemplo, aprendeu a jogar sem Aaron Lennon.

Imagem: The Guardian

5 de abril de 2010

Podcast - Rodada 33



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4 de abril de 2010

O sonho de Benítez

A aparente obsessão de Benítez pela Liga Europa prejudica o Liverpool

Adoramos criticar o futebol brasileiro. Não por aversão ao patriotismo, mas especialmente porque nossa desorganização provoca a distorção de conceitos. No ano passado, Santos e Botafogo foram eliminados da Copa do Brasil por CSA e Americano, respectivamente. Os tradicionais clubes estavam envolvidos em fases decisivas de seus campeonatos estaduais, de modo que Vágner Mancini e Ney Franco não deram a atenção recomendável à competição que realmente importava. Além do desempenho vexatório na copa nacional, os alvinegros não puderam vencer Corinthians e Flamengo nos torneios provincianos.

Hoje, porém, Rafael Benítez cometeu um erro à brasileira. O treinador do Liverpool parece ter decidido o que de fato pretende no fim da temporada. No sexto posto da Premier League, os Reds agonizam por uma vaga na próxima Champions. A seis rodadas do término do campeonato, a equipe estava em clara desvantagem em relação a Manchester City e Tottenham. Contudo, considerando a espinhosa sequência de mancunianos e londrinos, Benítez tinha o direito de acreditar na conquista da quarta posição. Para tanto, seria necessário um aproveitamento quase total dos últimos 18 pontos em disputa. De maneira inacreditável, o espanhol pôs em xeque hoje os três primeiros pontos em questão, os que poderiam ser ganhos diante do Birmingham.

Benítez decidiu poupar Mascherano, seu jogador mais consistente na temporada, e Agger. Até aqui, as escolhas parecem aceitáveis, uma vez que não conhecemos exatamente o nível físico dos atletas após a desgastante partida da última quinta-feira, contra o Benfica, pela Liga Europa. Mas o pior estava por vir. Antes da metade do segundo tempo, Rafa agiu de modo a disseminar perplexidade pelo St. Andrews e pelos cantos onde houvesse alguém acompanhando o jogo. Quando Fernando Torres cedeu seu posto a N'Gog, os torcedores viram ruir o sonho de vencer o difícil jogo, cujo placar marcava 1 a 1 (resultado final) àquela altura. Torres saiu visivelmente irritado e surpreso. O capitão Gerrard olhava para o banco como quem queria dizer: "meu treinador enlouqueceu".

Até o fim da peleja, N'Gog perdeu, de modo patético, três oportunidades claras. Apesar de o campo das hipóteses no futebol ser um tanto inócuo, não é exagero afirmar que, com Torres, o Liverpool teria vencido o Birmingham. No frigir dos ovos, Benítez trocou dois pontos, sua primeira vitória contra os Blues e o primeiro triunfo no St. Andrews de um dos seis primeiros colocados por alguns minutos de descanso de seu único atacante decente. Tudo por conta da Liga Europa. Seria deveras interessante para o Liverpool vencer o torneio continental, mas o que realmente importa é a vaga na Champions. A Fulham, Standard Liège, Benfica, alemães e espanhóis, a conquista pode ser prioridade. Ao Liverpool, movido a objetivos mais ambiciosos, não.

A atitude de Benítez soa imediatista, de alguém que parece buscar a autoafirmação através de um título que representaria pouco para o clube. E, sim, o espanhol justificou a alteração de maneira óbvia. "Torres estava exausto. N'Gog foi bom para nós porque forneceu um par descansado de pernas". Não é meramente clichê garantir que um Torres em condições apenas razoáveis é muito mais eficaz do que um N'Gog em plena forma. Agora, a chance de o Liverpool chegar à Liga dos Campeões é ínfima. É possível, inclusive, que a equipe termine na oitava posição - e, portanto, fora de qualquer competição europeia -, visto que Aston Villa e Everton estão no encalço. Benítez parece fazer força para deixar Anfield do mesmo modo que abandonou o Mestalla, ainda que, desta vez, sob olhares insatisfeitos: vencendo a Liga Europa (ou a competição equivalente).

Foto: Getty Images

2 de abril de 2010

Ultimato para o Chelsea

Quando, no primeiro turno, Terry cabeceou para o fundo do gol de van der Sar, o Chelsea abria cinco pontos de vantagem para o Manchester United. Agora, a seis rodadas do fim da Premier League 2009-10, os Red Devils, na liderança, recebem os Blues para confronto que pode ganhar contornos de decisão do campeonato. Como ambos têm pela frente jogos muito pesados, um empate não será bem-vindo mesmo para o Manchester United, à frente do Chelsea por um ponto. Quatro pontos atrás do conjunto de Alex Ferguson, o Arsenal espera por um tropeço mútuo para retomar o fôlego na corrida pelo título.

O Manchester United é, talvez ao lado do Everton, o time mais consistente do segundo turno. Desde janeiro, com raras exceções, a equipe de Old Trafford tem atropelado os pequenos e vencido as batalhas contra os grandes. No entanto, o maior dos últimos reveses gera desconfiança no noroeste inglês. A lesão de Rooney não deve tirá-lo da temporada ou da Copa, mas pode roubar do United a chance da "tríplice coroa" (ainda que aleijada, com a conquista da Carling em vez da FA Cup). Os Red Devils terão momentos cruciais, na Champions e na liga nacional, sem aquele que tem decidido tudo desde agosto.

Ainda assim, é certo que os mancunianos serão adversários duríssimos para os Blues. Com Vidic e Ferdinand em forma, a defesa fica muito mais segura. No meio-campo, a tendência é que joguem Fletcher, Carrick, Valencia, Nani e, na ligação imediata com o ataque, Park. À exceção de Carrick, todos estão em excelente fase. Isolado, Berbatov terá de vencer sua habitual apatia. Se repetir a atuação da goleada por 4 a 0 sobre o Bolton, quando Rooney foi poupado, o búlgaro já será útil e pode suplantar parte da carência ofensiva proporcionada pela ausência do Shrek.

Contudo, o Chelsea, que se recuperou de momento instável com duas goleadas (5 a 0 sobre o Portsmouth e 7 a 1 diante do ótimo Aston Villa), será um oponente respeitável, ainda que em Old Trafford. A confirmação dessa expectativa depende muito de Malouda, autor de nove gols em 2010. O francês passa por fase espetacular, tendo aparentemente superado a deficiência que o atormentou durante a maior parte da carreira: a finalização. Pendente à esquerda, Malouda terá a chance de explorar a lentidão de Gary Neville. Outro que deve estar bem confiante é Lampard. Após marcar quatro vezes contra o Villa, o sobrinho de Harry Redknapp parece, enfim, pronto para o protagonismo em uma temporada que não era tão brilhante.

Será fundamental, aliás, o trabalho do meio-campo do Chelsea. Mesmo com Rooney em grande forma antes da lesão, é essencialmente por ali que o Manchester United vencia seus jogos. Mikel e Ballack precisam ficar atentos à dinâmica de Fletcher, em temporada sensacional, e Park, sempre decisivo em jogos duros. Pelas pontas, além do duelo entre Neville e Malouda, haverá o embate entre os franceses Anelka, que constantemente cai pelo lado direito do ataque, e Evra. Aqui, o ex-lateral do Monaco deve levar vantagem. A tendência também é favorável ao United em Nani x Paulo Ferreira e Valencia x Zhirkov. Sem Ivanovic e Ashley Cole, os Blues perdem muito defensivamente.

Em compensação, Terry e Alex somam forças suficientes para dificultar o jogo de Berbatov e as velozes incursões de Park. O fato de Ancelotti já não precisar se aventurar com Hilário ou Turnbull também é confortante. Na outra ponta, Drogba deve voltar de modo impetuoso. Nas seis partidas do campeonato em que ele não foi titular, o Chelsea marcou 25 gols (incluindo as duas goleadas mais expressivas: 7 a 2 sobre o Sunderland e 7 a 1 contra o Aston Villa). Além disso, o marfinense precisa de uma atuação mais convincente, compatível com sua brilhante temporada, após a ineficácia contra Lúcio e a Internazionale no confronto que eliminou os Blues da Champions.

É muito difícil escapar da lógica do equilíbrio em partidas desse porte. Por outro lado, ainda não houve empates em jogos entre equipes do Big Four. Aliás, o Chelsea venceu todos os quatro encontros contra United, Arsenal ou Liverpool. Apesar do retrospecto e das goleadas recentes, é necessário que o time de Ancelotti trate o jogo de amanhã como um ultimato, a oportunidade derradeira de manter boas chances na luta pelo título. Em 2010 instável, os Blues precisam, na mais tenebrosa das hipóteses, empatar. E têm à disposição um cenário favorável: recuperação na hora certa, lesão de Rooney e maior tempo de descanso e treinamento (o United jogou na terça-feira, pela Liga dos Campeões).

Prováveis escalações:
Manchester United (4-4-1-1): van der Sar; Neville, Vidic, Ferdinand, Evra; Valencia, Fletcher, Carrick (Giggs), Nani; Park; Berbatov
Chelsea (4-4-2): Cech; Paulo Ferreira, Alex, Terry, Zhirkov; Mikel, Ballack, Malouda, Lampard; Anelka, Drogba

Palpite: Manchester United 1 x 1 Chelsea

Imagens: Team Talk, AFP

1 de abril de 2010

Sem munição

Gol de Fàbregas contra o Barcelona pode ter arruinado definitivamente a temporada do Arsenal

No início da temporada, era quase consensual a afirmação de que o elenco do Arsenal é o pior dos últimos anos. Em 2008-09, a quarta colocação na Premier League e o atropelamento imposto pelo Manchester United nas semifinais da Champions já deixavam claras as fragilidades de um time refém do tempo e da sorte. Para vencer, os Gunners precisavam, necessariamente, da evolução gradual de seus jovens jogadores. Assim, a parcela experiente do plantel seria fundamental para o processo, para sustentar as ambições do clube enquanto as apostas estivessem abertas, em desenvolvimento. As vendas de Kolo Touré e Emmanuel Adebayor para o Manchester City foram, nesse sentido, um golpe aparentemente definitivo às pretensões do Arsenal no curto prazo.

Isso, repito, no início da temporada. Agora, a análise é diferente. O progresso de Song, Diaby e Nasri é o principal símbolo da sobrevida da política de Arsène Wenger. Ainda que após algumas falhas, o Arsenal pode se orgulhar de sua posição em 2009-10, uma vez que sustenta possibilidades (ínfimas ou não, você pode interpretar) de conquistar as duas competições realmente importantes para o clube. A quatro pontos do Manchester United e a três do Chelsea na Premier League, os Gunners esperam o confronto direto entre os dois líderes e gozam de uma reta final mais tranquila. Na Champions, a equipe precisa repetir a façanha do Liverpool em 2007: vencer no Camp Nou.

Entretanto, observando a situação do time, não é difícil chegar à conclusão de que a temporada não deve terminar bem. Não é mais clichê injustificado ou mera lamentação: o índice de lesões no Emirates é abissal, incomum. Se consultarmos a tabela de contusões da Physio Room, veremos que os Gunners não ocupam a liderança em número de atletas inativos. E isso não significa rigorosamente nada. Há duas observações necessárias: o panorama é muito raro, o Arsenal quase sempre esteve entre os primeiros; os que se lesionam são justamente os jogadores-chave, que, por conta da escassez de opções, são constantemente atirados ao fogo, sem estarem totalmente recuperados de contusões anteriores.

De acordo com a previsão do portal, o Arsenal não terá Fàbregas (que já estaria fora por conta de suspensão automática), Arshavin, Gallas, Ramsey, van Persie, Gibbs e Djourou na segunda partida contra o Barcelona. A escalação poderia ser Almunia; Sagna, Gallas, Vermaelen, Clichy; Song, Diaby, Fàbregas (Ramsey); Nasri, van Persie, Arshavin. Mas certamente será Almunia; Sagna, Campbell, Vermaelen, Clichy; Song, Diaby, Nasri; Walcott, Bendtner, Rosicky. A primeira formação, mesmo com Ramsey na vaga de Fàbregas, seria capaz de derrotar, na Catalunha, o Barcelona de Gabriel Milito e Rafa Márquez. A segunda, porém, deve ser facilmente superada. Se Fàbregas fosse a única ausência, as chances de avançar seriam respeitáveis.

Por outro lado, a iminente eliminação na Champions pode ser interpretada de modo positivo. O Arsenal deve ter retornos de jogadores importantes em abril. Se o Manchester United, sem Rooney por um mês, seguir adiante, os Gunners seriam os únicos candidatos ao título inglês plenamente concentrados na Premier League. O insistente princípio da tabela mais fácil e a ainda pequena diferença para United e Chelsea criam o ambiente para uma arrancada. Ainda assim, o cenário de ontem, de três jogadores seriamente lesionados em apenas um jogo, não pode ser reeditado nem mesmo em menor escala. Hoje, não é exagero afirmar que o absurdo número de lesões custou - ou pode custar - ao Arsenal uma temporada bem-sucedida.

Imagem: Metro